CPO 2018 – Nairobi

CPO 2018 – Nairobi

ORDO FRATRUM MINORUM

QUEM TEM OUVIDOS

ESCUTE O QUE O ESPÍRITO DIZ

…AOS FRADES MENORES HOJE

(cf. Ap 2, 7)

DOCUMENTO

DO CONSELHO PLENÁRIO OFM

12-28 de junho de 2018 Nairóbi, Quênia

ROMA 2018

Capa: da série Vida de São Francisco

Atribuído ao laboratório de arte cuzqueño de Basílio de Santa Cruz, Museu de Arte Colonial San Francisco, Santiago, Chile.

OFM Communications Office Via di Santa Maria Mediatrice, 25 00165 Rome, Italy

www.ofm.org

© 2018

APRESENTAÇÃO

 

Caríssimos irmãos, o Senhor lhes dê a paz!

Apresento-lhes o Documento final do Conselho Plenário da Ordem 2018 e desejo fazê-lo a partir de um texto do Apocalipse sobre o qual refletimos durante a lectio divina oferecida a todo o Conselho:

“És perseverante, pois sofreste por causa do meu nome, mas não esmoreceste. Devo reprovar-te, contudo, por teres abandonado teu primeiro amor.  Recorda-te, pois, de onde caíste, converte-te e retoma a conduta de outrora. Quem tem ouvidos ouça o que o Espírito diz às Igrejas” (Ap. 3, 3-5.7).

Um texto forte e direto que brota do amor do Senhor para com sua Igreja, cuja perseverança, tenacidade e fidelidade em suportar a perseguição ele reconhece. Reprova-a e, ao mesmo tempo, corrige-a, porque ela abandonou a intensidade e o frescor do primeiro amor. Portanto, a convida a fazer memória das próprias quedas e a voltar às “obras do princípio”. Um itinerário que o Senhor traçou também para nós, convidando-nos a escutar a sua voz que nos alcança hoje através do mundo, da Igreja e da Ordem; exortando-nos a discernir quais caminhos empreender para renovar o nosso amor a Deus, às pessoas e a tudo o que ele criou; impulsionando-nos a sairmos para empreender as obras a que ele nos chama hoje.

Uma palavra que escuto dirigida a mim e a toda a Ordem. Ela nos pede com força e insistência para nos convertermos e para voltarmos à paixão originária, acolhendo a ação do Espírito Santo em nós com a mesma abertura e paixão do nosso seráfico pai São Francisco. Retornar ao nosso primeiro amor!

Escutando tantas intervenções e partilhas durante o CPO, vejo com alegria que nós, Frades Menores, estamos ancorados profundamente no Evangelho e no exemplo de Jesus. E é exatamente o Evangelho que nos ajuda a aprofundar a nossa fé,  a  nossa  esperança  e  a  nossa  capacidade  de  amar  e  de

Quem tem ouvidos escute o que o Espírito diz … aos Frades Menores hoje

 

sonhar. É o Evangelho que nos convida a chegar à paixão que Deus nutre para com cada um de nós, de modo a traduzi-la no nosso empenho concreto para com nossos irmãos, para com a Igreja e para com o mundo. O Evangelho é a força e a luz para a nossa contínua conversão. Tudo isto nos conduzirá a uma escuta concreta dos nossos irmãos, nos fará voltar o ouvido às esperanças, às desilusões e aos sonhos que cada um traz consigo.

Deixemos, então, que o Espírito nos conduza a um renovado amor pela Trindade e pelos irmãos da Ordem. O Espírito abrir-nos-á a escutar a voz   de Deus que fala no mundo e, ao mesmo tempo, a voz que se eleva do Povo de Deus e da criação. Deixemo-nos impulsionar ao nosso “primeiro amor”, a Deus e à centralidade da Trindade na nossa vida e assim seremos permeados em todo o nosso modo de pensar e de agir.

Eis, portanto, o Documento, fruto da reflexão dos Conselheiros e do Definitório Geral que viveram o processo sinodal, chegando a um texto que nos permite conhecer melhor a nossa realidade e pode ajudar a todos nós a colocarmo-nos em atitude de escuta, de oração e de reflexão, para discernirmos e, portanto, individuarmos caminhos concretos para colocar-nos em saída, respondendo com alegria ao Senhor que nos chama à conversão, para uma vida franciscana mais autêntica no mundo de hoje que muda tão rapidamente.

Espero que este texto permita a todos vocês percorrerem de novo os passos indicados e realizarem outros. O meu desejo, de fato, é que todos vocês, todas as Entidades, cada fraternidade e cada irmão continuem o caminho iniciado com o CPO e, por sua vez, nos vários contextos em que vocês vivem, levem adiante este processo de escuta, de discernimento e de saída.

O Documento conclui-se com algumas propostas concretas sobre três assuntos que consideramos fundamentais: a nossa identidade carismática, os jovens e o cuidado da “casa comum”. Isto não exclui que nos diversos países vocês possam dar atenção também a outros temas emergidos no CPO ou outros relacionados com o contexto em que vivem.

Peço, portanto, que cada Entidade da Ordem e cada fraternidade se coloque em tal processo e o traduza em escolhas concretas de vida.

Além disso, recordo que o CPO e este Documento, fruto de um processo de escuta e de leitura dos sinais dos tempos, são parte importante da caminhada para o Capítulo Geral de 2021, no qual deveremos refletir, discernir e decider sobre a vida da Ordem no futuro próximo, aproveitando

Quem tem ouvidos escute o que o Espírito diz … aos Frades Menores hoje

 

as oportunidades que a Igreja e o mundo nos oferecem.

Enfim, quero exprimir a minha gratidão aos Conselheiros pelo empenho na preparação e no desenvolvimento deste processo que nos fez escutar e discernir onde o Espírito de Deus está falando à Ordem hoje.

Roma, 01 de novembro de 2018

Festa de todos os Santos

 

Frei Michael Perry, ofm

Ministro Geral e Servo

Prot. 108545

 

SIGLAS E ABREVIAÇÕES

 

 

A.   Sagrada Escritura

1Sm    1º Livro de Samuel

2Pd     2ª Carta de Pedro

Ap       Apocalipse

Cl        Carta aos Colossenses

Dt       Deuteronômio

Ef        Carta aos Efésios

Hb      Carta aos Hebreus

Is         Isaias

Jo        Evangelho segundo João

Jr        Jeremias

Lc        Evangelho segundo Lucas

Lv        Levítico

Mc       Evangelho segundo Marcos

Mt       Evangelho segundo Mateus

Rm      Carta aos Romanos

Sl         Salmos

Sb       Livro da Sabedoria

B.       Escritos de São Francisco

2Fi      Carta aos fiéis (2ª recensão)

Ad       Admoestações

Cnt      Cântico das Criaturas

Ord     Carta a toda a Ordem

RB      Regra Bulada (1223)

RnB    Regra não Bulada (1221)

Test     Testamento (1226)

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C.        Biografias de São Francisco de Assis

 

1Cel     Vida do Bem-aventurado Francisco (Vita Prima), de Tomás de Celano

2Cel     Memorial do desejo da alma (Vita secunda), de Tomás de Celano

Fior     I Fioretti de São Francisco

LM      Legenda Maior, de Boaventura de Bagnorégio

LP       Legenda Perusina

D.       Outras

 

CCGG   Constituições Gerais da Ordem dos Frades Menores, Roma, 2010

EGGG   Estatutos Gerais da Ordem dos Frades Menores, Roma, 2010

EG         Evangelii Gaudium

GE         Gaudete et Exultate

LS          Laudato si’

RFF       Ratio Formationis Franciscana

VC          Vita Consecrata

INTRODUÇÃO

 

  1. O Conselho Plenário da Ordem (CPO), realizado em Nairóbi no mês de junho de 2018, quis escutar o que o Espírito diz à Ordem hoje. Para favorecer uma ampla e profunda escuta do Espírito, realizou-se uma  colaboração prévia dos Conselheiros: ativando diversos procedimentos de coleta dos dados; estudando temáticas da atualidade do mundo, da Igreja e da Ordem; elaborando os dados coletados e apresentados em forma de síntese durante o CPO, na sua primeira fase de escuta. Durante o CPO, os Conselheiros refletiram, trocaram ideias e fizeram o discernimento sobre os principais assuntos surgidos nas apresentações das Conferências. Houve uma ampla coleta das ideias e das observações surgidas com relação a vários assuntos, depois sistematizadas por uma comissão do Definitório Geral como texto-base para o presente documento.
  2. A metodologia escolhida foi a baseada no método “Escutar-discernir- sair”, com o escopo de envolver cada confrade da Ordem no conhecimento, no discernimento e em ações concretas; na escuta do que o Espírito nos diz hoje; em escolhas comunitárias que nos ajudem a reavivar a autenticidade do nosso carisma nas diversas partes do mundo.
  3. Os Conselheiros trouxeram à luz alguns dos temas mais importantes da realidade em que vivemos hoje. No presente texto faremos referência ao que diz respeito à vida da Ordem, relatando o que é de maior relevo e que interpela a nossa vida de frades. Em todo caso, é possível a cada um ler o que está relatado por extenso nos relatórios das Conferências.
  4. Dos relatórios e das discussões emergiu como em todo o mundo está em curso uma rápida mudança, consequência imediata da globalização, em uma época de “fluidez” que assumiu dimensões planetárias. Da análise dos diversos contextos nos vários continentes onde estamos presentes, emergiram aspectos muito positivos, como o crescimento da valorização da dignidade humana, o difundir-se do desejo de liberdade em geral, de liberdade religiosa, de igualdade, de aceitação do  pluralismo religioso, político e cultural. Notou- se também a difusão da consciência de quanto é necessário e urgente amar a criação e ter cuidado dela, olhando a nossa “casa comum” como dom de Deus.

Ao mesmo tempo, se viu como está diminuída a tolerância para com as injustiças, levando-se em conta que, com a globalização econômica, está crescendo a desigualdade social  em  todas  as partes  do mundo  e estão  se tornando mais profundas as injustiças sociais. Enfim, outro fenômeno elevado em nível planetário é o das migrações, derivadas de múltiplas causas, que geram migrantes e refugiados em muitas partes do mundo de hoje.

  1. No contexto da profunda mudança em ato, resulta dos relatórios que o papel da religião na sociedade é colocado em discussão. A centralidade sempre maior da individualidade conduziu também a um crescente assumir, da parte de muitos, um modo de viver a experiência da fé cristã de uma forma sempre mais individualista e privada. Nota-se que a Igreja perdeu muita credibilidade em muitos países da Europa, da América do Norte, da Austrália e da Nova Zelândia. Entre as maiores mudanças sociais da maioria dos continentes, em que o cristianismo era quase a única religião, encontramos hoje um pluralismo religioso não somente por causa da chegada de migrantes e refugiados, mas também pela sobreposição e entrelaçamento de diversos modos de perceber a vida.
  2. Focalizando-nos então na figura e no magistério do Papa Francisco, evidenciou-se no Conselho o quanto ele serviu de exemplo e de interpelações a uma renovada opção pelos pobres e pelos excluídos da sociedade. Ele nos chama a sermos uma Igreja em saída e empenhada com os mais pobres e a termos cuidado da “casa comum”. O seu entusiasmo por uma renovação da Igreja é partilhado e abraçado por muitos cristãos, tanto da Europa como da América do Norte. Mas, em algumas áreas, a Igreja não se deixou interpelar e não entrou em diálogo com estas provocações, mostrando pouco ou nenhum interesse pela Evangelii Gaudium, a Laudato Si’ e a Amoris Laetitia.
  3. Olhando as estatísticas, pode-se enfim ver que também a Igreja está em movimento e que cresce o número dos católicos batizados. Isto se pode aprofundar com a leitura do que foi publicado pela Secretaria de Estado do Vaticano no Anuário Pontifício 2017, disponível no Site:

https://press.vatican.va/content/salastampa/it/bollettino/ pubblico/2017/04/06/0222/00505.html(visitadonodia 29.06.2018)

Conselho Plenário OFM 2018

  1. “O número de católicos batizados tem crescido em nível planetário, passando de 1272 milhões em 2014 a 1285 milhões, com um crescimento relativo de 1%”. Mas se pode verificar este movimento de crescimento em alguns continentes, enquanto em outros se vê a diminuição. De fato, desde 2010, na África se registra um aumento de 19,4% de católicos batizados, na Ásia de 9,2%, na América de 6,7%, enquanto na Europa e na Oceania se evidencia certa estabilidade, mesmo havendo uma diminuição de aproximadamente 1,5%.
  2. No que se refere à vida religiosa masculina, os religiosos professos não sacerdotes diminuíram ligeiramente em nível planetário, com uma maior diminuição na Europa, América e Oceania e com certo crescimento na África e Ásia. Os religiosos sacerdotes estão “em baixa” na Europa e na Oceania, mostrando um significativo recuo também no continente americano, onde resultam pouco mais de 38 mil em 2015, contra mais de 40 mil em 2010”. De outro lado, “a África, a América Centro-Continental e a do Sul e a Ásia Sul- Oriental veem aumentar o seu peso de 2010 a 2015 (cf. o Site citado).

PARTE I

ESCUTAR

Escutar a realidade e os sinais dos tempos. Alguns textos para refletir

  1. “Os Frades Menores, inseridos no povo de Deus, atentos aos novos sinais dos tempos e respondendo às condições do mundo em evolução, sejam sempre fiéis ao sentir da Igreja, partilhem as iniciativas e as propostas dela e promovam-nas na medida de suas forças”; “Os frades, ‘pela caridade de espírito, sirvam e obedeçam de bom grado uns aos outros’ (RnB V, 14), buscando juntos os sinais da vontade do Senhor Deus”; “É necessário perscrutar os sinais dos tempos e interpretá-los à luz do Evangelho” (CCGG 4, 1; 7, 3; 102, 2).
  2. “A formação permanente habilita o Frade Menor a assumir uma atitude contemplativa capaz de escutar a Deus” (RFF 111).
  3. “Os cristãos, imersos nas ocupações e nas preocupações deste mundo, mas chamados também eles à santidade, têm necessidade de encontrar em vocês corações purificados que na fé veem a Deus, pessoas dóceis à ação do Espírito Santo que caminham ligeiras na fidelidade ao carisma do chamado e da missão” (VC 109).
  4. No CPO, fez-se referência a tantas temáticas complexas que dizem respeito à humanidade, à Igreja e à Ordem. Aqui relatamos somente o que se refere à Ordem, apresentando alguns aspectos críticos que consideramos sejam desafios a enfrentar neste tempo, como também o que o caracteriza positivamente. Um tesouro de bem inestimável que reflete por toda parte uma luz de Cristo e é maior do que as várias sombras.

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ESCUTAR A REALIDADE DA OFM HOJE

 NAS CONFERÊNCIAS

 

Vida dos Frades Menores

  1. Os Frades Menores hoje estão presentes em 119 países de todos os continentes. Nas últimas estatísticas, do fim de 2017, vemos a Ordem em movimento e em mudança. Numericamente, os Frades Menores são 13.153 e estão distribuídos do seguinte modo: Europa Oriental 2.399; Europa Ocidental 3.725; América do Norte 1.119; América Latina 3.228; Ásia e Oceania 1.580; África e Oriente Médio 1.266. Em comparação com 10 anos atrás, a Ordem diminuiu 12, 5%. De fato, no início de 2008, os Frades Menores eram 15.030, assim distribuídos nos continentes: Europa Oriental 2.499; Europa Ocidental 4.917; América do Norte 1.616; América Latina 3.609; Ásia e Oceania 1.301; África e Oriente Médio 1.088.
  2. Os números indicam uma diminuição maior na América do Norte (31% em 10 anos), seguida da Europa Ocidental (18% em 10 anos), enquanto continua em crescimento na África, Ásia e Oceania (18% em 10 anos). Substancialmente se pode ver que o movimento da Ordem continua o mesmo da Igreja.
  3. Um dos principais sinais de mudança das fraternidades franciscanas nas Conferências do Hemisfério Norte, e na América do Sul, mesmo se com menor intensidade, é o envelhecimento e a diminuição numérica muito rápida. Verifica-se a dificuldade sempre maior de cobrir todos os cargos assumidos, particularmente os concernentes à pastoral paroquial. Também este foi um fator que levou a um estilo de vida individualista, com consequências negativas para a qualidade da vida fraterna.

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Vida espiritual e vida fraterna dos Frades Menores hoje

  1. Além dos dados partilhados no CPO, pode ajudar-nos, nesta seção dedicada à escuta, também a referência à pesquisa sobre a Ordem dos Frades Menores no mundo, concluída em 2013 e coordenada pelo Prof. Renato Mion, do Instituto de Sociologia da Universidade Pontifícia Salesiana de Roma, que coloca em luz algumas dificuldades que repercutem na vida espiritual e fraterna. Da escuta dos frades emergiram os seguintes aspectos.

Dificuldade na leitura dos sinais dos tempos

  1. Das respostas vindas pode-se afirmar que a dimensão da atenção aos “sinais dos tempos”, como impulso e motivação ideal para a própria espiritualidade pessoal, foi substituída pela prevalência de uma atenção privilegiada ao próprio contexto imediato, tanto territorial como pessoal, colocando o acento em uma espiritualidade da vida cotidiana. Trata-se de uma escolha que foi feita sobretudo pelos mais jovens.

Dificuldade na vida espiritual 

  1. Aparecem com consciência bastante viva indicadores de crise para a própria vida espiritual. Isto é, o cuidado insuficiente da oração pessoal (41%), realidade que constitui o maior risco para a própria vida de fé. A essa segue a dificuldade concreta derivada de uma excessiva carga de trabalho (34%), à qual não corresponde um adequado apoio de satisfatórias relações fraternas (30%) e de guia também espiritual por parte dos ministros e guardiães. Aparece claramente realista a percepção de um difuso estilo de vida burguês (26%) que achata e arrisca enfraquecer sempre mais a própria identidade franciscana (25%).

Dificuldade na vida fraternal 

  1. Da indicação da pesquisa emergem problemas nas relações interpessoais e relevantes incertezas a respeito da identidade vocacional na Ordem. Um grande problema que envolve a metade dos frades (denunciado por 46%), em qualquer região em que se encontrem, é a falta de comunicação interpessoal. Trata-se daquela comunicação entre confrades que se constrói nas relações individuais interpessoais cotidianas, que deveriam ser feitas de simplicidade nos encontros, de confronto sobre os acontecimentos, de confidências também pessoais, de trocas diretas, de impressões partilhadas com familiaridade, de recíproco conhecimento, de informações também sobre a própria vida e sobre os próprios compromissos
  1. Outros índices de mal-estar dizem respeito à identidade carismática da vocação franciscana com 26% (com variantes nas regiões), dificuldade muitas vezes provocada mais uma vez pela pouca vida de fé e de oração comunitária. Emerge também um acentuado clericalismo na própria formação e missão (25,4%), a que se acrescenta uma notável influência da cultura moderna e sua pouca estima com relação à vida religiosa.
  2. Há outros fatores de risco, como a falta de organização da fraternidade (23,6%), que pode gerar aquela desordem indiferenciada do “tudo é permitido”, em que a própria autoridade não assume a responsabilidade da gestão e é denunciada como tal por 44,9% dos mais jovens com menos de 45 anos e por 33,1% de idade superior. Outro fator emergente é também a falta de partilha das escolhas da fraternidade, que chega a 48,5% para aquelas comprometidas com o apostolado e muito envolvidas na atividade pastoral.

Situações de crise

  1. Fala-se de crise em referência à realidade como: as dificuldades com relação à identidade como frades; a diminuição das vocações; o abandono da Ordem por parte de vários confrades; os problemas psicológicos e relações não superadas; as estruturas pesadas a manter; o individualismo e o clericalismo. Algumas Entidades procuram superar a mentalidade clerical também através da formação e dos encontros dos frades leigos. O problema subsiste ainda mais quando na mentalidade dos clérigos prevalece a visão de si mesmos e do próprio papel antes como sacerdotes e só em segundo lugar como frades. Em muitas partes do mundo, os frades buscam recursos econômicos para a gestão da sua vida pessoal sem partilhar com a fraternidade ou recorrendo a ela para as próprias necessidades, assumindo como modelo o estilo de vida dos sacerdotes diocesanos. Além disso, se estão empenhados diretamente em paróquia, tendem a viver com dificuldade a vida fraterna e a vida de oração.
  2. Outro aspecto é dado pela sensação de frustração vivida por vários frades de meia idade. Não há uma clara identificação na sua vida com a Ordem e com o carisma. De outra parte, há tantos outros irmãos que olham o futuro com otimismo, convictos de que o carisma franciscano tem muito a oferecer ao mundo hodierno.

Enfim, em algumas Entidades da Ordem falta um projeto de fraternidade e de missão. A maioria dos frades é dedicada à pastoral, mas existe pouco envolvimento como fraternidade. Algumas Conferências estão tentando dar um estilo fraterno à missão própria de cada fraternidade, de modo a viver e servir as paróquias e os santuários como Frades Menores, colocando a vida fraterna como centro propulsor do apostolado. Em todo caso, dos relatórios, vem evidenciada uma vitalidade muito grande e significativa dos Frades Menores em todas as Conferências.

A presença dos Frades Menores

  1. Em todo o mundo, uma das características que se mantém viva nos franciscanos é a proximidade às pessoas, independentemente das obras que levam em frente. Acolhimento, escuta, acompanhamento, ajuda, trabalho caracterizam a Ordem por toda parte. Acrescente-se também que os frades são apreciados, mesmo nos lugares em que a Igreja perdeu a confiança da sociedade. Sem dúvida, a figura de Francisco de Assis acompanha os frades em cada continente.
  2. Em todas as entidades da África, da América Latina, da Ásia e da Oceania, há paróquias nas periferias pobres, e muitas vezes há o envolvimento das pessoas simples como colaboradoras da missão evangelizadora e no papel de guias das comunidades católicas.
  3. E cada Conferência há presenças de fraternidades e de frades entre os diversos grupos de pessoas excluídas, como, por exemplo, pessoas com problemas de droga e de outras dependências, os camponeses sem terra no Brasil e na América Latina, pessoas abandonadas, vilas nas florestas, etc.
  4. É significativa a presença dos Frades Menores entre as populações autóctones e entre os indígenas das Américas, da Ásia e da Oceania, com os quais se desenvolvem atividades de evangelização integral, que promovem os direitos humanos e culturais deles e oferecendo algumas vezes as mais elementares formas de assistência.
  5. É evidenciada a presença significativa dos frades em lugares de violência, seja nos países em que subsistem conflitos e guerras, seja naqueles em que a violência é provocada pelo narcotráfico ou pelas quadrilhas criminosas. Isto acontece, por exemplo, nas Conferências da América Latina, onde os frades desenvolvem a sua missão também entre os projéteis, com risco da sua própria vida.  Algumas  das  nossas  Entidades mantêm centros de paz e de reconciliação, oferecendo um luminoso testemunho cristão correspondente ao nosso carisma. Infelizmente, evidenciou-se também que, às vezes, existem formas de violência até no interior das fraternidades, como por exemplo no exercício do poder ou em relações no interior da comunidade marcadas por agressividade, quando não até de hostilidade, pelas quais somos chamados a fazer escolhas e gestos concretos de reconciliação e de paz, a partir, antes de tudo, de nós, invocando de Deus o dom da conversão.

Opção pelos pobres

  1. Em cada Entidadedas Conferênciasháprojetosouaçõesparaospobres. Mais numerosos são os de caráter assistencial como Caritas, mesa dos pobres, dispensários. Mas existem também projetos de desenvolvimento humano- social, como microcrédito, banco alimentar, mesas sociais, Organização não Governamental (ONG) de cooperação para o desenvolvimento, hospitais para as curas paliativas, casas de acolhida para crianças abandonadas ou confiadas pela justiça, casas para acolher os sem teto, conventos ou partes de conventos cedidos para toxicodependentes, migrantes, anciãos.
  2. Há casas de formação, paróquias e outras presenças inseridas nos bairros muito pobres ou favelas que permitem partilhar a realidade simples das pessoas muito pobres.
  3. Também na Europa há pequenas fraternidades em bairros periféricos e desprovidos das cidades nos quais os frades podem partilhar a vida e servir o povo de Deus. Alguns dos nossos frades se inserem nos lugares e nas condições em que vivem as pessoas pobres, apoiando-as no esforço de melhorar também as condições sociais. Na América Central, algumas casas de formação foram criadas em áreas de grande pobreza e violência: na Nicarágua, Guatemala e El Salvador.
  4. Cada Província franciscana na Ásia Oriental enfrenta diversos desafios em nível político, econômico e religioso. Enquanto o conteúdo específico da tensão política e dos conflitos varia de país a país, os franciscanos são impelidos a promover a paz, a reconciliação e a justiça e, além disso, a prestar atenção aos pobres e aos marginalizados da sociedade.
  5. Na Conferência Anglófona os Frades  Menores  desenvolvem  o seu ministério também junto àqueles que  estão  à  margem  da  sociedade, especialmente os pobres, os sem teto, os migrantes e os indígenas. As Províncias de São João Batista (Cincinnati), Santa Bárbara (Califórnia) e Nossa Senhora de Guadalupe (Novo México) continuam uma tradição de mais de um século, oferecendo cuidado pastoral aos nativos americanos no Arizona e Novo México. Muitas Províncias continuam, há décadas, um serviço pastoral nas comunidades históricas de afro-americanos.
  1. Na África, os Frades Menores estão presentes e trabalham em realidades muito pobres. Os problemas sociais crescem com a pobreza, com as doenças pandêmicas, em contextos de grande instabilidade social e política. Daí deriva a necessidade de criar sempre mais estruturas que possam ajudar as pessoas a terem uma vida mais digna.

Acolhida de migrantes e refugiados

  1. Diante da grave situação da mobilidade humana  na  região  que  vai da América Central aos  Estados  Unidos,  a  Conferência  Santa  Maria de Guadalupe prevê alojamentos de apoio temporário para migrantes e refugiados de passagem naqueles territórios, junto aos quais estes possam  encontrar assistência jurídica e assistência sanitária para todas as necessidades que devessem encontrar (fome, violação dos direitos humanos etc.). Deve-se sublinhar o alojamento “La 72. Casa para o Migrante” em Tabasco, pelo qual passam quase 25 mil migrantes e refugiados por ano, e o apoio às iniciativas dos leigos que ajudam os migrantes, como “Las Patronas”, em Veracruz, ambas no México. Todas as Províncias da Conferência enviam à casa “La 72” frades em formação inicial para períodos que vão de um a seis meses.
  2. Na Europa, muitos Frades Menores se empenham em acolher os migrantes e os refugiados. Na Itália, as Províncias têm procurado construir projetos, dedicar conventos inteiros ou espaços conventuais e direcionar a obra de frades e de leigos à finalidade de acolher estes irmãos. Uma característica própria da Conferência Sul-eslávica é a pastoral dos emigrados. No mundo (fora do território da Conferência) há 187 paróquias, missões, comunidades e centros croatas católicos. O número dos croatas no exterior é estimado em aproximadamente três milhões.
  3. Na América do Norte há muitas iniciativas com relação aos migrantes e aos refugiados. A Província do Canadá está buscando revitalizar a aproximação missionária, em que o ministério paroquial coloca os frades em estreito contato com os imigrantes. Nos Estados Unidos, cada Província tem frades ou sustenta instituições que se dedicam ao serviço e à presença entre os novos imigrantes. A abertura de fraternidades baseadas em Ite nuntiate coloca os frades em contato com as necessidades dos pobres e dos migrantes. Uma destas fraternidades é internacional e está na fronteira entre Estados Unidos e México. Nos últimos anos, foram muitas as vocações provenientes de famílias de imigrantes.
  1. A Província da Imaculada de São Paulo, no Brasil, organizou o Serviço Franciscano de Solidariedade (SEFRAS), que é uma expressão de acolhida dos últimos da sociedade e mantém uma casa para imigrantes e refugiados que chegam dos países em conflito da África, do Oriente Médio e dos países latino- americanos e caribenhos.
  2. Muitas Entidades das Conferências da Ásia e da Oceania estão ativamente envolvidas em dar uma resposta aos desafios postos pelos migrantes através da abertura de “casas de êxodo” nos conventos e nas paróquias a eles confiados.

Diálogo ecumênico e inter-religioso

  1. As presenças dos Frades Menores na Terra Santa, Marrocos, Turquia, Rússia e Cazaquistão e em alguns países da África e da Ásia e Oceania são sinais de testemunho de diálogo ecumênico e inter-religioso. De fato, em todas as Conferências, muitos frades estão empenhados no diálogo com as culturas, com as outras confissões cristãs e religiosas.
  2. Na Terra Santa, é naturalmente importante e prioritário o diálogo ecumênico e o inter-religioso. Os fiéis de todas as crenças e religiões vivem um ao lado do outro e frequentemente partilham os mesmos lugares de trabalho, de educação e, no caso dos cristãos, também do culto. Tal diálogo, muitas vezes, é o único modo de salvaguardar a própria identidade e defender os próprios direitos no interior de uma sociedade de maioria não cristã. Uma das formas mais eficazes do diálogo são os encontros recíprocos em nível de Institutos de cultura e de educação, como é o caso do Instituto Magnificat, escola de música, que é aberto a docentes e estudantes hebreus, cristãos e muçulmanos. No Egito, há o Centro Franciscano do Musky, em Cairo, especializado nos Estudos Orientais Cristãos.
  3. Osfradesquevivemna Síriafalammuitasvezestambémdo ecumenismo de sangue, porque os cristãos das várias confissões se encontram todos unidos na escolha  de  permanecer  fiéis  a  Jesus  Cristo,  pagando frequentemente até a preço de sangue.
  1. Na Conferência Sul-asiática, os frades são ativos nos processos de solução de problemas: dos fundamentalismos sócio-políticos e religiosos, da perseguição religiosa e dos conflitos étnicos, colocando-se como agentes de paz e de harmonia, fundando comunidades inter-religiosas e conventos abertos como centros de acolhida e de paz. Há teólogos e pastores bem preparados nas Entidades que promovem a integração na liturgia e no culto das sonoridades e dos estilos musicais próprios das culturas étnicas e locais da Ásia, favorecendo o diálogo e uma maior inculturação com pessoas de fé diversa.
  2. Nos Estados Unidos, pode-se sublinhar a promoção da cooperação inter-religiosa. Por exemplo, o Song and Spirit Institute, da Província São João Batista, em Detroit, no espaço destinado à liturgia, hospeda regularmente celebrações comuns do Shabbat, círculos de diálogo muçulmanos, encontros de meditação dos budistas e reuniões de oração dos Quakers (Protestantes).

Cuidado da criação – JPIC

  1. Escutando as Conferências, percebe-se a consciência do fato de que esta é uma temática que interessa a toda a Família Franciscana e ao Movimento Franciscano de Justiça e Paz, mesmo se os Frades Menores que dele fazem parte sejam poucos, enquanto a presença maior é representada pelos membros da OFS e da JUFRA.
  2. Está crescendo na Europa a preocupação e a sensibilidade pela guarda da criação, mesmo se em muitos casos, especialmente entre os frades jovens, se assiste a certa influência de estilo consumista e indiferença, não sendo ainda clara a relação entre a guarda da criação, a luta contra a pobreza e a vida de minoridade.
  3. Alguns frades e algumas fraternidades da Conferência Transalpina Franciscana (COTAF) estão atentos em proteger o ambiente e a integridade da criação com o seu estilo de vida, assumindo a ecologia e a sustentabilidade como critérios importantes para a sua escolha. Por exemplo, foram realizados projetos concretos de implantação de energia fotovoltaica nos conventos e nas estruturas utilizadas pelos frades.
  1. Em 2017, as Conferências da América Latina realizaram uma peregrinação chamada Laudato si’. Dois ícones de São Francisco e de Santa Clara fizeram um percurso nas diversas comunidades, um do norte e outro do sul, para encontrarem-se no Equador. Durante a peregrinação, a família franciscana realizou diversos eventos para promover o conhecimento da Encíclica e colocar em prática as indicações nela contidas.
  2. Algumas Províncias dispõem de um programa sistematizado e estão encaminhando projetos (de reciclagem de pet, trabalhadores de sensibilização ambiental, atividade contra o bullying, contra a violência doméstica e de gênero, fórum e marchas a favor da paz).
  3. Na Conferência Brasileira, muitos frades estão empenhados na reflexão e na defesa do Rio São Francisco, que atravessa uma área de grande seca e está ameaçado pelos interesses econômicos. Deste rio dependem milhões de pessoas pobres, e a ação dos frades é um empenho profético que diz respeito à fidelidade ao nosso carisma. No extremo sul do Brasil, uma fraternidade está realizando junto aos pequenos agricultores a defesa da terra, buscando alternativas à monocultura e à agricultura industrial que estão destinadas a uma exportação destrutiva e que contamina. Em todas as Entidades, há frades envolvidos em atividades em defesa da agricultura orgânica e familiar, contra o uso e a difusão de sementes geneticamente modificadas; outros frades operam diretamente na reflexão e na denúncia dos abusos na atividade da mineração. Além destes, há o empenho a favor das pessoas mais pobres, para garantir os direitos deles como cidadãos e como trabalhadores.
  4. Os frades da Conferência Anglófona procuram encarnar os valores da JPIC com várias modalidades, entre as quais a defesa dos pobres e o desejo de colocar em prática a Laudato si’. Os frades malteses estão levando adiante o Projeto pegada de carbono (Carbon Footprint Project) para ajudar os frades a conscientizar-se sobre o uso da energia e reduzir efetivamente 30% em três anos a quantidade de carbono produzido pelo estilo de vida das fraternidades. No Canadá, os frades dão voz às preocupações pela ecologia e pelo desenvolvimento e empenham-se ativamente em preservar a terra e utilizá-la de maneira responsável para o ambiente.
  5. Na Conferência Sul-eslávica, os frades promovem e encorajam um desenvolvimento sustentável, juntamente com os centros eco pastorais a favor da ecologia.
  6. No entanto, devemos reconhecer que o empenho não é geral, mas diz respeito a um número restrito de pessoas. Alguns frades não consideram o JPIC essencial para o nosso carisma; ou acham que não podemos fazer nada para mudar a situação mundial; inclusive, para outros, o problema ambiental não é real; outros ainda, pelo contrário, estão convencidos de que se trata de escolhas políticas e de partidos. Geralmente em todas as Entidades foram nomeados animadores do JPIC, mas nem sempre a atividade deles é coordenada nem estão presentes estruturas que permitam tal coordenação. Cursos de formação são organizados em todos os países; no entanto, não se assiste a uma significativa mudança de atitude dos frades na vida ordinária. Em algumas partes se realizam projetos de reflorestamento e de reciclagem, mas sem que isto tenha grande impacto no âmbito da vida pessoal dos frades.

Ação social

  1. Além de partilhar a vida com as pessoas em tantos lugares, os frades, juntamente com os leigos e outras instituições, levam adiante projetos de caridade e assistência social, como centros de saúde, creches, alojamentos para os pobres e migrantes, centros de recuperação para toxicodependentes, a fim de dar uma resposta a problemas imediatos. Em quase todas as Conferências, há projetos de desenvolvimento humano, acompanhados pelos Frades Menores. Além disso, é desenvolvida muita promoção dos jovens através da oferta de cursos de formação profissional, oferta de ajuda e sustento às populações autóctones e às comunidades rurais, como também centros de formação integral com um bom nível de preparação escolar.
  2. Em São Paulo, o Serviço Franciscano de Solidariedade (SEFRAS), da Província da Imaculada, é uma expressão de acolhida dos últimos da sociedade e também um trabalho de articulação política para favorecer transformações sociais em que sejam privilegiados os excluídos da sociedade (moradores de rua, imigrantes, refugiados, crianças e anciãos em situação de vulnerabilidade social e outros). Todos os centros com este tipo de serviços, colocados juntos, acolhem mais de dez mil pessoas.
  3. Na Rússia e Cazaquistão, os frades estão empenhados também em importantes projetos sociais, educativos e caritativos que testemunham a minoridade e a solidariedade para com os pobres.
  4. Na Europa, há frades e fraternidades que vivem em um universo todo seu e não se interessam pelas questões sociais. Outros, pelo contrário, se empenham em uma ação social positiva com atenção a muitas questões atuais. Estão abertos a quem vem de fora e agem a favor dos marginalizados e dos pobres: dos sem teto, doentes, incapazes, ciganos, encarcerados, imigrantes.
  5. Na Conferência da Ásia e da Oceania, os frades gerem e trabalham em centros HIV-AIDS em muitas das nossas Entidades.

Pastoral de manutenção – Nova Evangelização

  1. A maioria dos frades empenhados nas paróquias e nos santuários dedica-se ao cuidado e serviço das pessoas, seguindo uma forma de pastoral ordinária. Há paróquias em que se busca diferenciar uma pastoral de manutenção, que é a predominante entre as pessoas mais anciãs e de fé tradicional, e uma pastoral de nova evangelização com grupos de leigos que aprofundam a sua fé e se empenham por sua vez na evangelização.
  2. Algumas Províncias da América Latina têm um projeto de Pastoral Integral, avaliado e completado à base dos desafios da realidade local. Algumas Províncias promovem e acompanham, conjuntamente com as Comunidades Eclesiais de Base (CEB), atividades de reflexão sobre a realidade, à luz do Evangelho, dando respostas práticas a problemas sócio eclesiais.
  3. Em diversas Conferências, há centros ou casas de oração em que os frades oferecem a todos uma oportunidade de aprofundamento da busca de Deus e da espiritualidade, apresentando particularmente a rica herança franciscana.
  4. As novas tecnologias de comunicação representam um verdadeiro e próprio “ambiente” onde as pessoas vivem, se encontram e se abrem à partilha. Como evangelizadores, particularmente com relação aos jovens, somos interpelados a ser presença significativa também no mundo digital.
  5. Em algumas Províncias da América do Sul, foram encaminhadas colaborações com canais televisivos e radiofônicos, e foram idealizadas páginas web e Facebook.
  6. Na Conferência Anglófona, há frades que usam os mass media para evangelizar, tais como e-mails, websites, blogs e vídeo pelo canal Youtube. Assim, cada dia, estão em contato com uma centena de milhares de pessoas, comumente jovens e adultos. Junto com esta presença na mídia, há fraternidades abertas a acolher jovens para uma experiência concreta de vida com os frades, pois o encontro pessoal não é nunca delegável ao mundo digital.

 

O mundo dos jovens

  1. Quanto à dimensão dos jovens no interior da Ordem, vem sublinhado como em diversas Conferências há jovens que refletem os estilos e a cultura da sociedade atual. Bastante familiarizados com a tecnologia, arriscam também eles a viver relações breves e intensas, mas pouco consistentes, imersos em um ambiente fluido e mutável que pode alimentar neles várias formas de insegurança e de instabilidade nas escolhas mais importantes, encontrando- se, às vezes, em graves dificuldades, quando não, se sentindo incapazes de elaborar momentos de crise e de dúvida quanto à sua escolha vocacional. Além disso, nota-se certa tendência por parte dos jovens frades a preferir os grandes centros urbanos em vez da missão nas áreas pobres e periféricas.
  2. Geralmente nas Conferências os frades promovem atividades com os jovens, e em quase todas as Entidades da Ordem se promove a JUFRA como uma das respostas às buscas dos jovens. As atividades com a juventude são diversas e variadas: missões, marchas, encontros, retiros em diversas modalidades, grupos etc.
  3. Como exemplo, vemos que, em todas as Províncias da Conferência Norte-eslávica, os frades estão fortemente empenhados no trabalho pastoral com crianças e jovens. Em todas as fraternidades florescem grupos de acólitos e de Juventude Franciscana.
  4. Além das atividades nas diversas Entidades, no ano de 2018, a Conferência Brasileira realizou a terceira edição do Encontro Nacional OFM dirigida aos Jovens.
  5. Na Conferência da Ásia, os frades têm programas para os jovens nas paróquias, promovem a JUFRA, organizam diversos grupos comunitários, grupos bíblicos de estudo, retiros vocacionais e motivacionais, empenhando os jovens em atividades comunitárias ao ar livre, como acampamentos, serviços caritativos e atividades esportivas. Além disso, muitos frades acompanham grupos carismáticos de jovens.
  6. Em diversas Províncias da COTAF, há fraternidades abertas a receber os jovens, onde estes podem encontrar os frades, morar com eles por períodos e partilhar o modo de viver e de  crer.  Algumas  Províncias  têm intensificado o cuidado da pastoral da juventude e a presença nas escolas; além disso, as paróquias e as escolas superiores organizam programas espirituais para os jovens do campo que vêm à cidade.

 PARTE II

DISCERNIR

Alguns textos para refletir

 

Escuta e discernimento em São Francisco de Assis

  1. “Guardemos, portanto, as palavras, a vida, a doutrina e o santo Evangelho daquele que se dignou rogar por nós ao Pai e manifestar-nos o nome dele, dizendo: ‘Pai, manifestei teu nome aos homens que me deste, porque lhes dei as palavras que me deste; e eles as aceitaram’” (RnB 22, 41-42).
  2. “Ouvi, senhores filhos e irmãos meus, prestai atenção às minhas palavras. Inclinai o ouvido de vosso coração e obedecei à voz do Filho de Deus. Guardai em todo o vosso coração os seus mandamentos e cumpri os seus conselhos com a mente perfeita. Porque quem provém de Deus ouve as palavras de Deus” (Ord 5-7.34).
  3. “Eu, Frei Francisco, vosso servo menor, vos rogo e vos suplico na caridade que é Deus, e com vontade de beijar-vos os pés, que, com humildade e caridade, devais receber, colocar em obras e observar estas e outras palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo. E todos aqueles e aquelas que as receberem benignamente, as entenderem e enviarem cópia aos outros e nelas perseverarem até ao fim, que os abençoe o Pai e o Filho e o Espírito Santo. Amém” (2Fi 87- 88).

 

Escuta e discernimento em São Boaventura

  1. “Não costumava preterir por negligência nenhuma visitação do Espírito. Na verdade, quando esta se lhe oferecia, ele a seguia e, entretanto que o Senhor lha concedia, saboreava a doçura oferecida. E quando, estando pelo caminho, sentia o sopro do Espírito divino, estando os companheiros a andar na frente, ele parava e, transformando a nova inspiração em fruição, não recebia em vão a graça” (LM X, 2, 1-3).
  2. “Examina a tua vida com uma meditação cotidiana. Pensa diligentemente nos teus progressos e regressos, considera a tua conduta nos costumes e nos sentimentos, observa quanto és semelhante ou diferente de Deus, quanto és próximo ou distante dele” (Solilóquio, I,
  3. “O homem, quando se cala, perscruta as suas vias e tem como considerar quão grande é a sua insuficiência e quão pequeno é o seu progresso (A vida perfeita para as irmãs IV, 3).
  4. “Como o amigo fica alegre por ouvir o que se diz sobre seu amigo e o doente fica alegre por ouvir os conselhos do médico, assim quem ama a Deus fica alegre ao escutar as Palavras de Deus” (Sermão 46. Trasladação de São Francisco).
  5. “O bem-aventurado Francisco pôde dizer ‘aprendei de mim, porque fui um verdadeiro discípulo de Jesus Cristo’, porque não foi um ouvinte desmemoriado da Palavra de Deus, mas alguém que a colocou em prática” (Sermão 59. Sobre nosso santo pai Francisco).
  6. “Francisco não era um ouvinte surdo do Evangelho” (LM I, 1).
  7. “Toda Escritura é coração de Deus, boca do Pai, língua do Filho, pena do Espírito Santo. O Pai fala mediante o Verbo, mas quem completa e o confia à memória é a pena do escriba, e este é o Espírito Santo” (Collationes in Hexaemeron, XII, 17).
  8. “Deus não fala só mediante palavras, mas também por meio de fatos” (Breviloquium, prólogo).

 

Escuta e discernimento no magistério de Papa Francisco

  1. “Dedica-se um tempo gratuito e sem pressa unicamente às coisas e às pessoas que se amam; e aqui se trata de amar a Deus que quis falar. A partir de tal amor, pode-se demorar por todo o tempo necessário, com a atitude do discípulo: ‘Fala Senhor, porque teu servo te escuta’ (1Sm 3, 9)” (EG 146).
  2. “Neste silêncio, é possível discernir, à luz do Espírito, os caminhos de santidade que o Senhor nos propõe. Caso contrário, todas as nossas decisões não passarão de ‘decorações’, que, em vez de exaltar o Evangelho na nossa vida, acabarão por recobri-lo e sufocá-lo. Para todo o discípulo, é indispensável estar com o Mestre, escutá-lo, aprender dele, aprender sempre. Se não o escutarmos, todas as nossas palavras serão apenas rumores que não servem para nada”. “Hoje em dia, tornou-se particularmente necessária a capacidade de discernimento, porque a vida atual oferece enormes possibilidades de ação e distração, sendo-nos apresentadas pelo mundo como se fossem todas válidas e boas”.

“Não nos esqueçamos de que o discernimento orante exige partir da predisposição para escutar: o Senhor, os outros, a própria realidade que não cessa de interpelar-nos de novas maneiras” (GE 150; 167, 172).

  1. “Com efeito, as novidades contínuas dos meios tecnológicos, o fascínio de viajar, as inúmeras ofertas de consumo, às vezes, não deixam espaços vazios onde ressoe a voz de Deus. Tudo se enche de palavras, prazeres epidérmicos e rumores a uma velocidade cada vez maior; aqui não reina a alegria, mas a insatisfação de quem não sabe para que vive. Então, como não reconhecer que precisamos de deter esta corrida febril para recuperar um espaço pessoal, às vezes doloroso mas sempre fecundo, onde se realize o diálogo sincero com Deus?” (GE 29).

 

OS FRADES MENORES

 

Em um mundo que muda rapidamente

  1. Vivemos em uma mudança epocal provocada pela ação humana sobre o planeta. Estamos, de fato, em uma época em que a humanidade e o planeta mudam muito rapidamente, como adverte o Papa Francisco na Encíclica Laudato si’ (cf. LS 18). “Embora a mudança faça parte da dinâmica dos sistemas complexos, a velocidade que as ações humanas lhe impõem hoje contrasta com a natural lentidão da evolução biológica” (ibidem). Também São Francisco viveu grandes mudanças no seu tempo, certamente com outros ritmos e com um olhar antropológico diferente, considerando o ser humano como “imagem e semelhança do Criador” (cf. RnB 23,1-3; Ad 5, 1) e considerando-o unitário em “corpo e alma” (cf. RnB 23, 8).
  2. Como a maior parte da humanidade, também os frades estão se empenhando por acompanhar a aceleração da transformação e da mudança social (cf. LS 18). A combinação de uma elevada complexidade e de uma rápida mudança faz com que a humanidade se encontre assaltada por uma fluidez e por uma incerteza nunca antes experimentadas. Estas mudanças apresentam aspectos tanto positivos como negativos, que, porém, não entram em categorias nítidas. As tecnologias e o desenvolvimento econômico tornam as nossas vidas mais confortáveis e conexas. Como também criam oportunidades para a aprendizagem e o diálogo. De outra parte, estas mesmas forças favorecem a secularização, o medo, a alienação, a depressão de massa, a exploração econômica e social e a degradação ambiental.
  3. Nós, Frades Menores, em meio a esta incerteza, confirmamos o nosso fundamento evangélico e a adesão ao nosso carisma franciscano e aos valores franciscanos como forma de vida (cf. RnB 22; RB 1; Test 14; CCGG 1, 2). Continuamos a encontrar Deus neste mundo que muda, e não só nós, porque estamos circundados por muitos outros modos de manifestar e  viver  a   própria   fé   com   consequente   enriquecimento  e edificação recíproca. Isto nos vem recordado particularmente pelos nossos frades provenientes da Ásia e da África. Isto significa que podemos testemunhar melhor o valor do nosso carisma franciscano (cf. CCGG 83, 1; 84; 87 2; 89).
  1. Os Frades Menores estão empenhados na leitura atenta do que muda e do que permanece, como também buscam reconhecer quais são as tendências a favorecer e apoiar e quais, ao contrário, as que ainda necessitam de análise e de mais profunda compreensão nos seus desdobramentos, seja enquanto apelo a uma conversão, seja enquanto provocação a acolher novos desafios e possibilidades de presença fraterna e de testemunho evangélico. A sociedade, as suas instituições e as normas comportamentais estão mudando. Em alguns casos, muito velozmente para que possamos acompanhar. Os frades pedem assistência da parte de peritos para compreender estes fenômenos, mas, em última análise, cabe sempre a nós ler os sinais dos tempos (cf. EG 51). “Cada vez que buscamos ler na realidade atual os sinais dos tempos, é oportuno escutar os jovens e os anciãos” (EG 108).
  2. No meio de todas estas mudanças, os Frades Menores são decisivos para não ser passivos. As potências tecnológicas, econômicas e políticas submergem-nos deliberadamente com sobrecargas de informações e tentam manipular-nos para fazer de nós consumidores passivos de um mercado sem ética (EG 57). O conselho de São Paulo aos Romanos é o de não se conformarem “à mentalidade deste mundo, para discernirem a vontade de Deus, o que é bom, agradável a ele e perfeito” (Rm 12, 2).

 

Fraternidade contemplativa em missão

  1. Durante as nossas reflexões no CPO, o tema da Fraternidade apareceu mais vezes, especificamente o tema do nosso chamado a ser e a viver como fraternidade contemplativa em missão. Isto quer dizer que a oração pessoal e comunitária é reconhecida como prioridade junto com a vida de fraternidade.
  2. A vida em fraternidade é um assunto, como os próprios Conselheiros sublinharam, sobre o qual se refletiu e se discutiu em tantos encontros nossos e em vários níveis da Ordem. De um lado, portanto, se reforçou que já existem muitos documentos sobre o tema da fraternidade em missão. De outro lado, reconheceu-se, nos relatórios das Conferências e nos vários grupos do CPO, que se trata de um aspecto essencial da nossa vida e sobre o qual é  sempre  necessário  retornar,  porque  nunca  se pode considerar realizado ou definitivamente adquirido. Antes, é um aspecto que sempre devemos cuidar, reconhecendo o quanto São Francisco viveu e pediu aos Frades Menores (cf. Ord 2; RB 8; 12; RnB 5; 18; 19; Test 27.33).
  1. O primeiro artigo das nossas Constituições Gerais, ao apresentar as características de uma vida radicalmente evangélica, depois de ter indicado o espírito de oração e devoção, faz referência à nossa vocação à comunhão fraterna, esclarece assim que a comunhão fraterna não é alguma coisa de opcional, mas um traço fundante, colocado somente após a centralidade de Deus. Afirma-o também o artigo 38, que abre o capítulo III, dedicado à vida fraterna: “Os irmãos, como filhos do Pai celeste e irmãos de Jesus Cristo no Espírito Santo e seguidores da forma evangélica revelada pelo Senhor a São Francisco, levam vida fraterna em comum, amam-se e nutrem-se mutuamente mais do que uma mãe ama e nutre seu filho carnal”.
  2. Portanto, não só como resposta às situações mutáveis do nosso mundo, que frequentemente provocam solidão e isolamento, mas, sobretudo, devemos considerar cada dia a nossa fidelidade a este elemento essencial da nossa formae vitae, como resposta ao Senhor que “nos deu irmãos” e, com o dom dos irmãos, continua a chamar-nos à vida evangélica em fraternidade.
  3. Durante o diálogo no CPO, diversos grupos insistiram para acrescentar a palavra “contemplativa” ao termo “fraternidade”. Isto para sublinhar a centralidade de Deus na nossa vida fraterna, assim como vem dito também nas Constituições Gerais com a expressão “em espírito de oração e devoção” (CCGG 1, 2), que constitui o primeiro elemento de uma vida radicalmente evangélica (cf. Test 14-15), a única dimensão colocada antes da comunhão fraterna. Compreende-se então que a primeira consequência da nossa comunhão com Deus é a comunhão fraterna.
  4. Alguns irmãos se perguntaram se o secularismo, que influencia a nossa cultura em muitas regiões em que se encontra a Ordem, não está também muito presente em nós e nas nossas fraternidades. Recordamos que, no Estudo sobre o estado da Ordem concluído em 2013 com o apoio de uma pesquisa aplicada a 1500 irmãos, à pergunta sobre que incide mais negativamente no impulso da própria vida religiosa, quase a metade dos entrevistados (40,8%) notaram o insuficiente cuidado da oração pessoal. Na mesma pesquisa, quando indicaram as soluções para a revitalização da Ordem, os irmãos propuseram, em primeiro lugar, um maior cuidado das relações em fraternidade (53, 9) e, em segundo lugar, o aprofundamento da qualidade da vida   spiritual  pessoal  (41,5%)  (cf. Prof.  Renato  Mion, Sintesis dell’indagine sullo stato dell’Ordine, Cúria Geral OFM, Roma, 2014).
  1. É verdade, portanto, que a comunhão fraterna é construída sobre a base de uma autêntica relação com Deus. No entanto, é também verdade que a fraternidade, quando é autêntica, se torna uma escola de oração, um espaço privilegiado no qual, com o apoio dos irmãos, aprendemos a buscar e servir a Deus (cf. CCGG 40).
  2. Outro elemento que se evidenciou como essencial, quando refletimos sobre a fraternidade, foi o da “missão”, tanto que foi pedido que se falasse de “fraternidade em missão”. Segundo o art.1 das nossas Constituições Gerais,   a missão é uma característica constitutiva e essencial da nossa vocação a uma vida radicalmente evangélica. Diz também o art. 83, § 1: “Assim como o Filho foi enviado pelo Pai, todos os irmãos, guiados pelo Espírito Santo, são enviados a proclamar o Evangelho a todas as criaturas no mundo inteiro e, pelo testemunho que dão de sua voz, façam saber a todos que ninguém é onipotente senão Deus”.
  3. Com esta expressão, as nossas Constituições Gerais, inspiradas pelo Evangelho de São João e pelas palavras de São Francisco de Assis (cf. Jo 20, 21; Ord. 9), nos recordam o caráter missionário da nossa vocação: como o Filho foi enviado pelo Pai, assim os irmãos são enviados a proclamar o Evangelho no mundo. Portanto, todas as estruturas da Ordem (Cúria Geral, Províncias, Custódias e Fundações e cada uma das fraternidades locais) e os modos com que nos organizamos em todos os níveis devem refletir esta intuição vocacional e original: somos uma missão neste mundo; este é o motivo pelo qual existem os Frades Menores, e a este estamos dedicados completamente.
  4. Nas nossas reflexões sobre o chamado a ser uma fraternidade contemplativa em missão, foram assinaladas duas ameaças que frequentemente danificam a experiência da nossa vocação e missão como irmãos menores: o individualismo e o clericalismo.
  5. Os frades consideram o individualismo uma ameaça para a comunhão e consideram que a questão deva ser continuamente enfrentada. O individualismo fecha o irmão em si mesmo, de modo a induzi-lo a interromper a sua referência à fraternidade, especialmente no exercício das suas atividades pastorais. O irmão age em seu nome, não leva em conta os projetos fraternos e não partilha com a fraternidade a caminhada da atividade e os frutos que daí derivam.  Tal atitude,  sempre mais frequente em tantos irmãos, contradiz a nossa identidade carismática e o nosso chamado à evangelização em fraternidade, que é o “primeiro e mais luminoso testemunho do Evangelho e sinal profético da nova família humana” (CCGG 87, 2).
  1. O clericalismo, de outra parte, é uma mundanização do exercício do ministério ordenado e aparece quando a Igreja não é considerada um “mistério” da graça, mas antes em termos sociológicos e políticos, não mais  o “serviço”, mas o “poder” que modela a atividade ministerial. Deste modo, o clericalismo “vai extinguindo pouco a pouco o fogo profético de que a Igreja inteira é chamada a dar testemunho no coração dos seus povos. O clericalismo esquece que a visibilidade e a sacramentalidade da Igreja pertencem a todo o povo de Deus e não só a poucos eleitos e iluminados” (Papa Francisco, Carta ao Cardeal Marc Ouellet, Presidente da Comissão Pontifícia para a América Latina).
  2. Os mesmos perigos podem ser indicados para a nossa Ordem e para a sua missão que, segundo a vontade do próprio São Francisco, se distingue das suas origens por ser uma “fraternidade” em que todos eram simplesmente “irmãos” e “menores”, sem discriminações nem preferência devidas a ministérios, títulos acadêmicos ou presumidas proeminências “eclesiais”.
  3. A mentalidade clerical está muitas vezes ligada ao autoritarismo e à arrogância, à busca do status e à autogestão do dinheiro recebido através do trabalho. Deste modo, o clericalismo prejudica a nossa vida fraterna e minorítica, obscurecendo assim a nossa missão profética.

 

Em relação aos jovens

  1. Os jovens são assim exortados pelo Papa Francisco: “Não tenham medo de escutar o Espírito que lhes sugere escolhas audazes, não protelem quando a consciência lhes pede para arriscar para seguir o Mestre. Também a Igreja deseja colocar-se à escuta da voz de vocês, da sensibilidade, da fé de vocês; até das dúvidas e das críticas de vocês. Façam ouvir o grito de vocês, deixem-no ressoar nas comunidades, façam-no chegar aos pastores. São Bento recomendava aos abades que consultassem também os jovens antes de cada escolha importante, porque ‘muitas vezes é exatamente ao mais jovem que o Senhor revela a melhor solução’” (Regra de São Bento, III, 3) (Carta do Papa aos jovens por ocasião da apresentação do Documento Preparatório da XV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, 13.01.2017). O profeta Jeremias queria fugir da missão, mas Deus o tinha escolhido ainda jovem (cf. Jr 1, 6), assim como tinha feito com Samuel (cf. 1Sm 3, 1-21) e outros profetas.
  1. “Os jovens chamam-nos a despertar e a fazer crescer a esperança, porque trazem em si as novas tendências da humanidade e nos abrem ao futuro, de modo que não permaneçamos ancorados na nostalgia de estruturas e hábitos que não são mais portadores de vida no mundo atual”, assim se expressa Papa Francisco na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium n. 108.
  2. De fato, em muitas partes do mundo se vê como “são muitos os jovens que oferecem sua ajuda solidária diante dos males do mundo e empreendem várias formas de militância e de voluntariado” (EG 106). No âmbito da Igreja, onde há jovens, constata-se o “crescimento de associações e movimentos prevalentemente juvenis” que o Papa interpreta “como uma ação do Espírito que abre estradas novas em sintonia com as expectativas deles e com a busca de espiritualidade profunda e de um senso de pertença mais concreto” (EG 105).
  3. Não obstante, amaiorpartedosjovensdehojeestámuitoenvolvidano mundo virtual. Não desejamos abandonar os jovens, pelo contrário, queremos ir aos jovens, lá onde eles estão, oferecendo-lhes experiências do mundo real, como alternativa ao virtual (por exemplo, com a cultura, o esporte, a arte e a criação). Além disso, queremos promover sempre “o apostolado da educação da juventude, na medida do possível, também nas escolas, de modo que os leigos venham corretamente formados para o serviço da Igreja e da sociedade e sejam cultivadas as vocações eclesiásticas e religiosas” (cf. EEGG 60).
  4. Outro aspecto tão emergente hoje, que envolve não só os jovens, é o mundo digital. Um mundo complexo avaliado só em alguns aspectos durante as discussões do CPO e que requer amplo confronto e aprofundamento. Muitos adolescentes e jovens adultos expressam sentimentos longe das instituições e da religião. Ao mesmo tempo, muitos desejam um senso de pertença, de experiências espirituais e de comunhão. Os social network digitais conectam e alienam simultaneamente. Esta revolução tecnológica está plasmando profundamente o modo como nos relacionamos e olhamos a realidade e também o modo como percebemos a nós mesmos.
  5. É notável o trabalho feito por muitos frades com a JUFRA em todo o mundo, como também a Pastoral Vocacional, ajuda válida para a vida dos jovens. Esta aproximação permite o encontro pessoal com Jesus que muda a vida através do exemplo de São Francisco e outras propostas evangélicas fortes.
  1. Os frades são chamados a deixar-se desafiar pelos jovens de hoje, para poder compreender quem são os jovens, quais desejos e germes de vida nova trazem em si e assim ajudá-los no seu caminho de crescimento humano e espiritual. Deveríamos iniciar com uma espiritualidade do encontro que abra a uma espiritualidade dos sacramentos. Se escutamos os jovens sem julgá-los, podemos entrar no seu mundo e aprender muito deles e da sua visão da realidade. Podemos contribuir para um encontro profundo dos jovens com São Francisco, encontro que desemboque também em opções radicais e em escolhas evangélicas de vida, acompanhando-os no caminho de um progressivo conhecimento e união com Deus.
  2. Em referência ao cuidado da criação, “os jovens exigem de nós uma mudança. Eles nos perguntam como é possível que se pretenda construir um futuro melhor sem pensar na crise ambiental e nos sofrimentos dos excluídos” (LS 13). Além disso, nos países que deveriam produzir as maiores mudanças com relação ao estilo de vida consumista e não respeitoso para com o meio ambiente, os jovens têm uma nova sensibilidade ecológica e um espírito generoso, tanto que alguns lutam de modo admirável pela defesa e o cuidado da casa comum, enquanto outros que cresceram em um contexto de altíssimo consumo e de bem-estar têm grande dificuldade para adquirir novos estilos de vida. Por isso, estamos diante de mudanças importantes que envolvem a todos e nos abrem a novos desafios educativos (cf. LS 209).

 

Interpelados pela Encíclica Laudato si’

  1. No que se refere ao empenho pelo cuidado da criação e pela promoção da justiça e a paz, deve-se reconhecer que a sobriedade no estilo de vida e a sensibilidade pela solidariedade ecológica e social são expressões próprias do carisma franciscano.
  2. Nós, frades, devemos ser um ponto de referência e um recurso para a Igreja e para a sociedade no que se refere a uma ecologia viva e integral. Francisco de Assis inspirou o mundo, inclusive o Papa Francisco na Encíclica Laudato si’, na criação de uma maior atenção à nossa mãe Terra. O Papa Francisco declara que o Santo é o exemplo por excelência da ecologia integral (cf. LS 10), mas nós ainda não abraçamos plenamente tal visão profunda. São Francisco “chamava todas as criaturas com o nome de irmão e de irmã” (cf. 1Cel 81) e via nelas o reflexo da bondade e da beleza do Criador (cf. Sb 13,   5; Cnt; 2Cel 165), o poder e a divindade dele (cf. Rm 1, 20). Por isso, o nosso empenho pela ecologia é parte integrante do nosso carisma franciscano que faz de nós irmãos menores de todas as criaturas.
  1. Ainda devemos empenhar-nos com a decisão n. 19 do Capítulo Geral de 2015: “cada fraternidade no projeto de vida e missão elabore um programa ecológico que promova estilos de vida que manifestem o respeito e o cuidado pela criação”.
  2. Alguns frades e fraternidades já estão empenhados em um trabalho consistente de atualização da Laudato si’ na vida concreta. Talvez falte ainda um maior conhecimento e aprofundamento destas temáticas por parte das fraternidades da Ordem. Muitos exemplos de empenho concreto por parte dos frades vêm de diversas partes do mundo: centros eco-pastorais que ensinam o desenvolvimento sustentável em áreas rurais da Índia; o acompanhamento e o apoio a projetos para os camponeses nas florestas na América Latina; a Peregrinação Laudato si’ na América Latina; as “paróquias verdes”, nas quais são promovidas e projetadas várias formas de atividade sustentável partilhada na comunidade paroquial; o uso de energia renovável, como painéis solares e tecnologias semelhantes; projetos de ecologia humana (como a defesa dos direitos dos pobres ou ações e projetos contra as injustiças e a violência sofridas pelas populações mais frágeis (cf. LS 5 e 15). O empenho e a responsabilidade de todos devem convergir para o bem do ser humano (cf. LS 118), uma vez que “são inseparáveis as preocupações pela natureza, pela justiça para com os pobres, pelo empenho na sociedade e pela paz interior” (LS 10).
  3. Temos uma  vasta  ação  de  evangelização  com  a  possibilidade  de utilizar novos e existentes módulos e instrumentos, como subsídios homiléticos, recurso a websites, cursos educativos. O Evangelho leva-nos imediatamente à relação com a criação, como Jesus diz no Evangelho de Mateus: “Olhai os pássaros: não semeiam nem colhem nem fazem provisões para o futuro, mas é o vosso Pai que está nos céus que os nutre. E vós valeis mais do que os pássaros” (Mt 6, 26). O fato é que nem “sempre nós, cristãos, recolhemos e fizemos dar fruto as riquezas que Deus deu à Igreja, onde a espiritualidade não está desligada do próprio corpo nem da natureza ou das realidades deste mundo, mas vive com elas e nelas, em comunhão com tudo o que nos rodeia” (LS 216), pelo que o Papa nos convida à “conversão ecológica” (cf. LS 216-221).

 

Interpelados pelas situações dos migrantes e refugiados

  1. O atual crescimento da migração humana interpela-nos. Como seres humanos e como franciscanos somos profundamente tocados e envolvidos pelas esperanças, pelas ânsias e pelos sofrimentos de tantos migrantes e refugiados. Segundo o exemplo de Cristo e no espírito de São Francisco, que nos convida a estarmos alegres quando vivemos “entre pessoas de pouca conta e desprezadas, entre os pobres e fracos, entre enfermos e leprosos e entre os que mendigam ao longo das estradas” (RnB 9, 2), sabemos que devemos acolhê-los e recebê-los com gentileza e generosidade.
  2. De outra parte, como Frades Menores, peregrinos e forasteiros neste mundo, somos chamados não só a recusar toda propriedade pessoal (cf. RB 6, 1; CCGG 72), mas a ser com o nosso estilo de vida sinais da transcendência e testemunhas da plenitude dos bens que nos é oferecida e que se alcança além dos limites do espaço e do tempo. Deste modo, a nossa forma de vida afirma que a nossa pátria verdadeira e definitiva se encontra além, que os bens que agora temos não nos pertencem, propondo assim novas relações com Deus, com os outros e com as criaturas.
  3. Neste Horizonte de compreensão, ser “menores” quer dizer abandonar todo desejo de domínio, toda atitude e forma de prepotência: “Não somos deuses. A terra precede-nos e foi-nos dada… Definitivamente, ‘do Senhor é a terra’ (Sl 24, 1), a ele pertence ‘a terra e tudo o que ela contém’ (Dt 10, 14). Por isso, Deus nega toda pretensão de propriedade absoluta: ‘As terras não poderão ser vendidas para sempre, porque a terra é minha e vós sois junto a mim como forasteiros e hóspedes’ (Lv 25, 23)” (LS 67). Compreende- se assim que só vivendo com autenticidade a nossa minoridade, só a partir da experiência da bondade de Deus, o único proprietário, bom e generoso, que tudo criou com amor, poderemos contribuir para edificar a fraternidade universal.
  4. Esta visão franciscana da vida, que encontra na revelação bíblica os seus fundamentos, nos faz entender que um só é o nosso Pai e que nós somos todos irmãos (cf. RnB 22, 34-35) e que estamos unidos por elos invisíveis com todos os seres do universo e formamos uma espécie de família universal. Isto nos leva a um sentimento de união com todos os seres da natureza, particularmente nos enche de ternura, compaixão e preocupação pelos outros seres humanos e nos impele a um constante empenho pelos problemas da sociedade (cf. LS 89; 91): “Tudo está em relação, e todos nós, seres humanos,  estamos unidos como irmãos e irmãs em uma maravilhosa peregrinação, ligados pelo amor que Deus tem para com cada uma das suas criaturas e que nos une também entre nós, com terno afeto, ao irmão sol, à irmã lua, ao irmão rio e à mãe terra” (LS 92).
  1. Portanto, não podemos permanecer indiferentes à grave crise da mobilidade humana, não podemos estar indiferentes à situação dos nossos irmãos migrantes.
  2. Os frades estão trabalhando com comunidades de migrantes e/ou refugiados em todo o mundo, ou melhor, somos uma rede global a serviço dos migrantes nos países de origem e de destino. Podemos ainda potenciar a colaboração com a Família Franciscana e outras organizações (cf. CCGG 88). Queremos utilizar as nossas estruturas nas duas extremidades das rotas dos migrantes. Poderíamos estar em condições de ajudar os potenciais migrantes a compreenderem melhor os riscos da viagem e as expectativas irrealistas que alguns migrantes têm sobre as condições, uma vez chegados ao seu destino. Em alguns casos, poderíamos estar em condições de contribuir para facilitar o retorno dos migrantes, mas em outros, como no caso de vítimas do tráfico de seres humanos, é necessária uma estratégia para a integração. Algumas Conferências estão colaborando para fornecer uma rede de segurança e apoio nas duas extremidades da rota de migração ou ao longo da própria rota. Isto poderia ser repetido em outras Conferências ou entre as Conferências.

 

No mundo como instrumentos de paz

  1. A violência continua a flagelar a humanidade, especialmente a mais pobre, mas com novas modalidades. A violência contemporânea assume a forma da violência doméstica, da violência de gênero, da violência política e religiosa e da econômica com relação aos pobres. Propaga-se como abuso da nossa irmã Mãe Terra (cf. Cnt) e do nosso sistema climático. Manifesta- se nas quadrilhas criminosas e na retórica política dos nacionalismos, além de que nas guerras reais, na corrida aos armamentos, no narcotráfico, no terrorismo, no tráfico de pessoas, nos meios de comunicação violentos (filmes etc.), nas violências operadas via Internet e na corrupção. O Papa Francisco fala de “iniquidade” como geradora de violência por falta de oportunidade de crescimento para todos os países (cf. EG 59-60), mostrando que, para enfrentar a violência, é necessário promover uma economia justa e transparente em nível global (cf. Is 32, 17).
  2. Jesus defendeu as pessoas da violência (cf. Jo 8, 1-7) e propôs horizontes de paz e de harmonia aos seus discípulos (cf. Mt 20, 25-26). Com referência a Cristo, São Paulo afirma que ele “é a nossa paz” (cf. Ef 2, 14), aquele que “pacificou o mundo com o sangue da sua cruz” (cf. Cl 1, 20). O caminho para a paz realiza-se interiormente, portanto, no encontro com Cristo e na conversão pessoal e, exteriormente, nas nossas fraternidades e no mundo através da busca da construção de relações fundadas na comunhão e na paz. Em várias situações, o sacramento da reconciliação pode ser fonte de paz e de mudança para uma vida mais de acordo com o Evangelho.
  3. Todos os cristãos são chamados à paz que se realiza e se constrói também ao realizar a missão de cuidar dos pobres e dos sofredores, como pediu Jesus Cristo (cf. Lc 4, 16-21; Mt 25, 31-46; Jo 10; Lc 15) e como o realizou, desde cedo, a Igreja primitiva (cf. Hb 113, 3).
  4. São Francisco decidiu pregar a penitência e a paz. Na Regra não Bulada, ele recomenda: “Atendamos, irmãos todos, ao que diz o Senhor: Amai vossos inimigos e fazei o bem àqueles que vos odeiam” (RnB 22, 1). Recomenda, além disso, que a saudação dos frades seja voto de paz (cf. RB   3; RnB 14; Test 23) e que os Frades Menores sejam pacíficos e portadores de paz (Ad 13; 15; Cnt 11; RnB 17,15). Com a sua vida, foi homem de paz e promoveu-a e construiu-a em diversas ocasiões, como no encontro com o Sultão (cf. 1Cel 20,57), “a ponte de paz” em Gúbio (cf. Fior 21) e em Assis  (cf. LP 84). O gesto de ir ao encontro do Sultão é símbolo por excelência de diálogo e de encontro de paz entre as culturas e as religiões.
  5. O Papa Francisco, quando fala da ecologia integral, faz referência ao necessário bem comum que “exige a paz social, quer dizer, a estabilidade e a segurança de uma determinada ordem, que não se realiza sem uma atenção particular à justiça distributiva, cuja violação gera violência”; e fala que “toda a sociedade tem obrigação de defender e promover o bem comum” (LS 157). Depois, recorda o que o Papa Paulo VI tinha inserido na Populorum Progressio: a paz “não se reduz a uma ausência de guerra, fruto do equilíbrio sempre precário das forças. Ela se constrói dia a dia, na busca de uma ordem querida por Deus, a qual comporta uma justiça mais perfeita entre os homens” (cf. EG 219). E ainda deseja que os católicos sejam construtores da paz como artesãos: “Jesus disse-nos: ‘Bem-aventurados os promotores da paz’ (Mt 5, 9). Neste empenho, também entre nós, se realiza a antiga profecia: ‘quebrarão as suas espadas e delas farão arados’ (Is 2, 4)” (cf. EG 244).

 

Religiosos com a visão de Igreja do Papa Francisco

  1. O Conselho Plenário da nossa Ordem quis ser uma ocasião privilegiada para escutar o que o Espírito diz aos Frades Menores hoje. Seguindo esta dinâmica, já desde a apresentação dos relatórios dos delegados das Conferências e depois no diálogo facilitado nos grupos, seja para aprofundar as realidades expostas seja para discernir o que o Senhor queria dizer-nos, os participantes do CPO encontraram um ponto de encontro na inspiração e no desafio que a pessoa e o ministério do Papa Francisco constituem para os Frades Menores hoje.
  2. Com a escolha de seu nome, Papa Francisco inspira-nos e desafia- nos, já desde o início de seu pontificado. Poucos dias depois da sua eleição, de fato, contou que escolheu o seu nome por causa de São Francisco de Assis, porque aquele nome lhe recordava os pobres e ele queria voltar a sua atenção aos mais fracos, aos últimos. Para Papa Francisco, São Francisco é o homem da pobreza, da paz e do amor pela criação.
  3. Deste modo, o Papa nos inspira a renovar a nossa vocação e o nosso carisma e a reforçar o nosso empenho de vida segundo o exemplo de São Francisco, dando ênfase na atualidade aos valores franciscanos e aos da vida religiosa em chave franciscana. Ele nos chama a colocar Jesus no centro das nossas vidas, a criar uma cultura da misericórdia e do encontro e a sair às periferias com alegria por estar com os pobres. Na Exortação Evangelii Gaudium, ele afirma que “um claro sinal da autenticidade de um carisma é a sua eclesialidade, a sua capacidade de integrar-se harmoniosamente na vida do Povo de Deus para o bem de todos” (EG 130).
  4. Papa Francisco desafia-nos, como Frades Menores, a irmos ao fundo da nossa identidade franciscana, vivendo a minoridade em fraternidade e no serviço ao Povo de Deus. Recordamos que, além de assumir o nome de Francisco, uma entre as suas primeiras escolhas foi a recusa de qualquer símbolo de poder e de vaidade. Quis continuar a portar a sua cruz de ferro, a locomover-se a Roma com um carro ordinário, a morar na Casa Santa Marta, o albergue onde se hospedou durante o conclave. Anunciou um jubileu dedicado à misericórdia; falou com coragem e frequentemente do pecado de clericalismo; muitas vezes, chamou a atenção da Igreja e dos religiosos para  a urgência de sair, para ir ao encontro dos necessitados; estabeleceu um dia mundial anual dos pobres; escreveu uma encíclica sobre o cuidado da criação, iniciando-a com as primeiras palavras do Cântico das Criaturas: Laudato si’.
  5. Por isso, o Papa Francisco nos desafia e encoraja a arriscar. O seu exemplo e os seus ensinamentos nos impulsionam a viver com autenticidade a nossa minoridade, a abrir-nos a todos para partilhar com eles o ideal de fraternidade universal. Deste modo, ele nos convida à revisão dos nossos provincialismos, das nossas estruturas de governo e da forma e dos modelos da nossa vida religiosa.
  6. A sua visão da vida religiosa é uma visão que compreende a profecia, a itinerância, a centralidade de Cristo, a promoção da comunhão fraterna entre nós, com as pessoas e com o ambiente, particularmente com os pobres. No seu discurso aos frades capitulares, no dia 26 de maio de 2015, sublinhou os dois elementos essenciais da nossa identidade: a minoridade e a fraternidade. Para ele, “minoridade significa também sair de si mesmo, dos próprios esquemas e visões pessoais; significa ir além das estruturas, ir além dos hábitos e seguranças, para testemunhar concreta proximidade aos pobres, aos necessitados, aos marginalizados, em uma autêntica atitude de partilha e de serviço”.

PARTE III

SAIR

  1. Os Conselheiros reunidos no CPO, depois de ter escutado as descrições de situações e de escolhas que caracterizam as diversas realidades em que se encontram os Frades Menores no mundo e depois de ter discutido nos grupos de trabalho, expressaram várias sugestões para que a nossa Ordem, e cada confrade, possa encontrar aí uma ajuda para uma renovada adesão à vocação franciscana, encarnando-a no mundo de hoje em tão rápida mudança.

 

COMO FRADES MENORES

 

Em um mundo que muda rapidamente

  1. Através da nossa fraternidade em missão, como discípulos de Cristo e filhos de São Francisco, iluminados pelas palavras do Evangelho, queremos ajudar de modo ativo e criativo este mundo que está mudando tão rapidamente. Podemos iniciar a partir de algumas perguntas surgidas nas discussões em assembleia e que podemos apresentar a cada uma de nossas fraternidades: O que está mudando? O que está mudando em nós? O que nós estamos mudando? Como propomos a teologia e a eclesiologia? Quais os conteúdos da nossa pregação?
  2. Desejamos oferecer novas vias para envolver a sociedade e os pobres; oferecer novas linguagens para falar de Deus no contexto desta convulsão social; e poder assim continuar a testemunhar os valores do Evangelho e o carisma franciscano. Queremos incrementar e aprofundar o diálogo e promover e cuidar da escuta permanente por nossa parte como Frades Menores, tanto no interior como no exterior das nossas comunidades.
  3. As culturas estão mudando com diversas luzes e sombras. Surgiu durante o Conselho Plenário a pergunta: os seres humanos estão mudando ou é a nossa compreensão da natureza humana que muda? Talvez a mudança na humanidade seja acidental e não substancial. Para responder a tão importantes e complexos interrogativos, será fundamental ser ajudados por peritos e por irmãos competentes para termos instrumentos que iluminem e acompanhem o discernimento em fraternidade.

 

Como Fraternidade contemplativa em missão

  1. Além da reflexão sobre nosso chamado a ser fraternidade contemplativa em missão, durante o CPO foram feitas também propostas concretas para os nossos irmãos e as várias Entidades. Eis a seguir algumas entre as mais importantes.
  2. Cada Entidade, e cada fraternidade, é, portanto, convidada a uma leitura ou análise da realidade e do contexto em que está inserida e em que executa a própria missão, para reconhecer os sinais dos tempos à luz do Evangelho, do nosso carisma, da doutrina social da Igreja, para depois atualizar a forma de vida franciscana na realidade em que vive.
  3. Cada fraternidade, e cada irmão, deveria levar esta realidade antes de tudo à presença de Deus na oração. Todas as fraternidades e todos os irmãos são, portanto, convidados a viver o tempo de oração, tanto comunitária como a pessoal, em relação e em proporção com o tempo empregado na evangelização.
  4. Também o tema do individualismo poderá ser enfrentado nos programas de formação permanente e inicial, de modo que se promova um estilo fraterno e de recíproca colaboração ao assumir e ao viver os serviços pastorais.
  5. Poder-se-ia encorajar a evangelização também através de fraternidades internacionais que poderiam favorecer o encontro e a integração das diferenças, oferecendo através da colaboração fraterna um testemunho franciscano no nosso estilo de vida e de ação.
  6. Cada Entidade poderia conduzir uma revisão dos compromissos ministeriais institucionais, para favorecer o mais possível estilos de colaboração fraterna e serviço, evitando atitudes clericais entre os irmãos.
  7. Com relação ao envolvimento e uma plena participação dos irmãos leigos na vida e na missão da fraternidade, cada Entidade é convidada a ativar estratégias e modalidades que favoreçam a plena inclusão e colaboração deles nos vários níveis.
  8. É necessário cuidar bem dos programas de formação para os guardiães e os formadores, incluindo a formação humana, sobretudo no que diz respeito ao diálogo e à comunicação interpessoal, o trabalhar e o projetar juntos de modo eficaz.
  9. Reforça-se a importância da elaboração do Projeto fraterno de  vida e de missão, de modo que todos os frades sejam envolvidos nas diversas atividades, em uma maneira de fazer projetos que levem em conta as várias dimensões da  fraternidade, favorecendo as capacidades e os recursos de cada um e da comunidade no seu conjunto. No projeto deve-se considerar com atenção a perspectiva da missão própria no contexto em que cada comunidade vive, fazendo com que os frades coloquem a vida fraterna como centro propulsor da atividade pastoral.

Com relação aos jovens

  1. Muitos frades estão empenhados na evangelização e na catequese dirigida aos jovens e se valem de várias linguagens como, por exemplo, a arte, a música, a cultura, e através de temas como o cuidado da criação. Muitos outros temas podem ser propostos, especialmente à luz da Laudato si’. Entrar em contato e em diálogo com os jovens significa usar linguagens e categorias comunicativas que os atinjam também dentro do mundo digital da mídia social, para convidá-los e envolvê-los a participar concretamente da vida eclesial, com propostas evangélicas fortes, tanto em âmbito espiritual como em âmbito de serviço, dando alegria e significado à vida deles.
  2. Ao mesmo tempo, os jovens estão fortemente interconectados e inspiram-se através de contatos que têm (mesmo superficiais) com pessoas de outras culturas, países e continentes. Frequentemente sabem mais sobre os acontecimentos em outros lugares distantes com relação aos anciãos. Como podemos utilizar melhor a network digital e os social media para promover um empenho profundo, não superficial, com Deus e a realidade? Podemos e deveríamos fazê-lo com a participação e a voz ativa dos jovens, indo aos jovens e com os jovens. As Entidades da Ordem poderiam convocar grupos de jovens e jovens adultos para oferecerem colaboração e ajuda aos frades sobre como proceder e agir neste âmbito.
  3. Os frades desejam estar abertos aos jovens para escutá-los e acompanhá-los de modo autêntico e integral. Desejamos aproximar-nos deles e acolhê-los sem julgá-los. Queremos amá-los com coração livre, para o bem deles e não para atraí-los a nós, mas para conduzi-los ao encontro pessoal com o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Queremos mostrar as razões da nossa alegria e oferecer os valores da nossa vida e missão. Em cada fraternidade é fundamental que existam momentos de oração com os jovens, mesmo ecumênica e inter- religiosa. Além disso, é considerada importante a formação dos frades para construírem pontes entre as gerações
  4. Os frades buscam mudar ou adaptar o modo de viver franciscano, de modo que possa ser relevante para a cultura e o mundo próprio dos jovens. Os valores franciscanos centrais são imutáveis, mas as modalidades para vivê-los e testemunhá-los podem e, às vezes, devem mudar. Como podemos crescer no saber discernir entre o que é essencial (e deve ser preservado) e o que é flexível no nosso modo de viver?
  5. Os nossos irmãos guardiães poderiam levar este tema aos capítulos de fraternidade, perguntando-nos, por exemplo: como fraternidade, como podemos estar abertos aos jovens? Pois as nossas casas são chamadas para estar abertas aos jovens de modo que eles possam experimentar a nossa forma de vida evangélica e abrir-se ao encontro com Deus. De outra parte, é urgente que todas as nossas presenças ofereçam um ambiente acolhedor para os frades jovens. As nossas casas de formação poderiam incluir intencionalmente frades mais anciãos, e isto poderia dar lugar a uma experiência de formação recíproca entre gerações. Estas mesmas atenções expressas pelos frades para os jovens valem também em geral para os aspirantes e os frades jovens.

 

Comprometidos com a Encíclica Laudato si’

  1. Individualmente, como fraternidade, como Entidade e como Ordem internacional, nós nos sentimos fortemente interpelados a fazer uma clara e radical opção pelas modalidades de vida indicadas pela Laudato si’. Para ser um farol da experiência ecológica, somos chamados a uma opção radical para viver autenticamente o nosso carisma e empreender um caminho de conversão ecológica (cf. LS 5; 216-221). Propomos isto para o próximo Capítulo geral como um dos temas para que possamos comunicar ao mundo inteiro uma visão franciscana de esperança ecológica para todos.
  2. Queremos empenhar-nos na formação dos frades com instrumentos leves e velozes fundados nos valores franciscanos (como, por exemplo: o “percurso ecológico” realizado na França, vídeo tutorial sobre o tema no site web OFM, etc.) particularmente em perspectiva de uma “ecologia humana”. Seria auspicável traduzir o documento Laudato si’ em diretrizes para a vida dos frades e para a pregação.
  3. Temos o Escritório JPIC para a animação dos frades, mas seria oportuno encaminhar cursos também nos centros de estudos da Ordem para formar pessoas dentro e fora da Ordem. Isto poderia ser assunto em nível franciscano inter-obediencial? Poderia a Pontifícia Universidade Antonianum tornar-se líder mundial nesta matéria? Cada Entidade da Ordem deveria inserir na formação inicial e permanente o tema da evangelização no espírito da Laudato si’ com especial acento na ecologia humana.
  1. Os Frades Menores desejam realizar a visão da Laudato si’ através de networks e a colaboração com outros grupos, organizações, especialistas e movimentos sociais. Embora o rico patrimônio da nossa tradição e espiritualidade franciscana nos permita oferecer uma rica contribuição ao diálogo, há outras organizações que trabalham neste campo, à escuta das quais podemos colocar-nos, das quais podemos aprender muito e às quais podemos unir-nos para colaborar em projetos comuns.
  2. A Laudato si’, além disso, exige maior diálogo em nível científico, ecumênico e inter-religioso. Podem os frades oferecer uma plataforma para um diálogo sobre a Laudato si’, constituindo um lugar de encontro? Como podemos entrar em parceria para promover uma mais efetiva difusão do espírito da Laudato si’?
  3. Queremos dirigir-nos especialmente aos jovens, porque eles estão voltados para o futuro, são mais capazes de mudança e são mais abertos ao ensinamento catequético da Laudato si’. É importante que demos a nossa contribuição ao traduzir a Laudato si’ de encíclica a indicações de vida e de pregação, de documento escrito, a documento vivido. Como podemos envolver os frades a empreender uma formação a este respeito?

 

Comprometidos com os irmãos migrantes e refugiados

  1. Além da reflexão sobre a migração humana e as nossas atitudes e além da partilha sobre projetos concretos já em ato, durante o CPO foram feitas ulteriores propostas concretas para os nossos irmãos e para as várias Entidades. Eis em seguida o que surgiu.
  2. Os frades gostariam de encaminhar uma reflexão teológica partilhada com relação à migração, à base da qual formular programas de formação inicial e permanente em vista de uma espiritualidade de acolhimento dos migrantes. Como parte desta formação, e para o nosso chamado à minoridade, pobreza e itinerância, se considera que seja necessário ter lugares e ocasiões concretas de encontro com os imigrantes. Devemos reconhecer que alguns frades estão bastante distantes dos migrantes, outros espantados, outros obsessivos pela perspectiva de segurança. Na elaboração destes programas de  formação,  além do  Secretário  para  a  Formação e os Estudos, poderia ser envolvido o Secretário para as Missões e a Evangelização, em colaboração com o Escritório de JPIC e Franciscans International.
  1. Reconhece-se que é necessário dar uma formação e qualificação profissional aos frades que estão mais envolvidos neste âmbito. Além disso, seria útil criar fóruns onde se possam apresentar ideias e exemplos de respostas a esta problemática e nas quais os frades possam participar, partilhando ideias, propostas e projetos provenientes dos diversos continentes. Isto poderia gerar uma série de iniciativas mais amplas entre os frades, com um envolvimento em diversos níveis, seja ad intra seja ad extra.
  2. Tendo presente que frequentemente a mídia contemporânea distorce dramaticamente a realidade da migração global, alterando as informações com preconceitos nacionalistas e racistas, juntamente com uma correta reflexão teológica franciscana, é necessário aprofundar uma análise social do fenômeno migratório, para inspirar e dar consistência ao nosso compromisso e às nossas ações. Poderia ser desenvolvido um processo como o do CPO para compreender melhor esta realidade, com ideias e respostas exemplares partilhadas entre as Conferências e com a Ordem inteira.
  3. Este estudo do fenômeno migratório deve levar em conta as características que esse tem em cada área, as suas motivações, os seus riscos e oportunidades. Deve-se prestar atenção também à migração interna nos próprios países, assim como ao problema do tráfico de pessoas. De fato, sabemos bem que dentro dos fluxos migratórios pode haver tráfico humano e organizações criminosas que favorecem as migrações por interesses econômicos.
  4. É necessário colaborar com outras instituições para fornecer formação, kit de recursos e apoio. Os frades poderiam desenvolver uma organização em condições de fornecer respostas imediatas às emergências? Poderia haver um programa de formação profissional para ajudar os frades a responder de modo eficaz?
  5. Como irmãos, não deveríamos só servir os migrantes, mas também, onde é possível, oferecer espaços de acolhida nos nossos conventos e na nossa vida fraterna, sempre salvaguardando o que é necessário à nossa vida consagrada. Queremos fazer tudo o que está em nosso alcance para ajudá-los a integrar-se nas suas novas sociedades, para fornecer-lhes o acesso aos bens e aos serviços, para apoiá-los em obter uma casa nos seus novos ambientes de vida. Queremos trabalhar nas nossas paróquias e com as instituições locais para ajudá-los a encontrar abrigo, alimento, instrução e uma ocupação. Queremos colaborar com as estruturas presentes no território. Podemos, enfim, enfrentar esta missão como uma Ordem internacional, ativando múltiplos recursos com que podemos contar.
  1. Sabemos bem que as pessoas deixam os seus países de origem por muitas razões, entre as quais a fuga da violência, das perseguições políticas, das formas modernas de escravidão e na busca de uma vida melhor para si mesmos e para as suas famílias. Por outro lado, é necessário um olhar crítico atento, porque aí também pode haver tráfico humano e outras organizações criminosas que exploram os movimentos migratórios e os promovem.

 

No mundo como instrumentos de paz

  1. Fiéis ao nosso carisma e à grande história de pacificadores, nós, Frades Menores, desejamos atuar para ser instrumentos de paz e reconciliação, continuando a estar presentes nos lugares de guerra e de violência, para não abandonar os que sofrem. Temos necessidade de apoiar e dar formação específica aos irmãos que queiram atuar nestes lugares. Não pensamos na presença de frades individualmente, mas antes na de fraternidades contemplativas em missão que sejam presença construtora de paz, sinal humilde e forte daquela paz que Deus quer para toda a humanidade.
  2. Os Frades Menores aspiram tornar-se portadores e construtores de paz. Por isso, temos necessidade de formação no âmbito da não violência ativa, com experiências e instituições que possam ajudar-nos a tornar-nos sempre mais instrumentos eficazes de paz. Este é o pressuposto para acolher, edificar e difundir a paz.
  3. Para promover uma espiritualidade e uma cultura da paz e da não violência, queremos unir-nos às redes já existentes e empenhadas, em nível nacional e internacional, a favor da paz, da justiça, do desenvolvimento e da promoção humana. Desejamos aprender da experiência dos nossos irmãos da Terra Santa, do Sudão do Sul, da Síria, de Mindanao (Filipinas), de El Salvador e de outros lugares de conflito e compreender como nós estamos presentes e agimos.
  4. Nas nossas fraternidades é necessário desenvolver programas de formação “ad intra” para fazer emergir e superar a violência que temos dentro de nós, na pessoa, nas relações fraternas e na linguagem. Propõe-se utilizar também material adequado produzido pelo Escritório JPIC OFM.
  5. É bom recordar a todos nós, Frades Menores, o empenho pedido pelo Capítulo geral de 2009: “Promover a não violência ativa na nossa vida, com uma atenção particular para a solução dos conflitos; dedicar especial atenção aos excluídos das nossas sociedades, de acordo com a situação de  cada Entidade, empenhando-se particularmente para a defesa e promoção dos direitos humanos; considerar e promover o uso ético dos recursos econômicos e naturais na vida dos frades, no ministério deles e na sociedade” (Portadores do Dom do Evangelho, 43).

 

Com a visão de Igreja do Papa Francisco

  1. Diante desta inspiração e destes desafios expostos nos números precedentes, os Conselheiros interrogaram-se do seguinte modo.
  2. Podemos criar vias que respondam criativamente a estes desafios que nos vêm tanto de São Francisco como do Papa Francisco?
  3. Como podemos dar melhor concretude “à eclesiologia e à ética da misericórdia” proposta pelo Papa Francisco?
  4. Desejamos ser fiéis ao espírito do nosso fundador, vivendo hoje como frades e menores. São Francisco, no seu Testamento, exorta-nos a fazer continuamente memória da nossa vocação de ser uma fraternidade contemplativa em missão. Em qual medida o exemplo e os ensinamentos do Papa Francisco nos ajudam a reavivar tal memória?
  5. Desejamos sonhar e ao mesmo tempo ser profetas de esperança, capazes de anunciar o Evangelho para a construção do Reino, denunciando  e combatendo as situações concretas de injustiça e de violência no mundo atual. Esta atitude nos fará dar muito fruto como pessoas consagradas que somos, sobretudo protegendo-nos da tentação que poderia tornar estéril a nossa vida consagrada, que é assim definida pelo Papa Francisco: a tentação da sobrevivência (cf. Homilia do Papa Francisco, Basílica Vaticana, 2 de fevereiro de 2017). A preocupação da “sobrevivência” paralisa-nos, torna-nos temerosos, lentamente e sem que percebamos nos fecha nas nossas casas e nos nossos esquemas.  Queremos  ter  um  coração contemplativo, capaz de discernir como Deus caminha pelas estradas das nossas cidades e dos nossos bairros, presentes no meio das pessoas e por toda parte, em toda a criação.

CONCLUSÃO

 

… PARA PARTIR DE NOVO

  1. Vivendo a experiência do CPO, tomamos consciência mais profunda de como o Pai chama a nós, Frades Menores, para vivermos e agirmos no mundo de hoje profeticamente em fraternidade. Vida profética significa uma existência que seja testemunho do amor, da misericórdia e da bondade de Deus e sinal de uma Igreja que é mãe de todos e tem particularmente no coração os pobres, as pessoas mais frágeis e sofredoras e aqueles que são migrantes e refugiados, constrangidos a fugir de seus países por causa das condições  insustentáveis em que vivem. Vida e ação profética significa também ir além de uma ação pastoral de pura manutenção para dedicar-nos a uma evangelização mais ampla, oferecendo a todos o anúncio de salvação do Senhor morto e ressuscitado por nós. Isto  implica ser porta-vozes da Palavra e da vontade   de Deus junto a todos e, em particular, a favor dos últimos, enfrentando abertamente as forças que ameaçam a vida, as estruturas que expulsam os mais vulneráveis da sociedade e os projetos econômicos que destroem e poluem o ambiente. Vida e ação profética significa, portanto, assumir uma existência que gaste todas as forças e as capacidades que o Senhor nos deu para construir o Reino de Deus.
  2. Viver e agir profeticamente significa, além disso, viver uma vida religiosa franciscana radical e visível, que não tenha medo de abraçar a justiça e a causa do Evangelho, mesmo quando vem perseguida, caluniada e difamada (cf. Mt 13, 9-13). Pois assim foi Jesus no momento em que se dedicou abertamente à edificação do Reino (cf. Jo 15, 20) e, segundo a sua palavra, assim acontecerá aos seus, estando estes associados à própria missão dele. Enfim, vida profética significa vivenciar cada experiência, inclusive a perseguição, em um horizonte e em um estilo fraterno.
  3. As temáticas principais individuadas e, portanto, aprofundadas no CPO foram sete, e aqui as resumimos: em um mundo que muda rapidamente; fraternidade contemplativa em missão; o  mundo  dos  jovens;  o  cuidado  da casa comum (Encíclica Laudato si’); migrantes e refugiados; no mundo como instrumentos de paz; vida religiosa e visão do Papa  Francisco. Para    os próximos anos, propomos que os frades em todo o mundo e em todas as Entidades valorizem pelo menos três temáticas surgidas e aprofundadas no CPO e lhes deem a concretude de projetos partilhados nos vários níveis da vida da Ordem.

 

A – No interior da Ordem queremos qualificar mais a nossa vida fraterna e aprofundar a nossa identidade carismática

  1. O diálogo acontecido  durante  o  CPO  revela-nos  que  em  todo  o mundo é necessário renovar continuamente o nosso empenho em dar qualidade à vida fraterna. Propomos, portanto, seguir as orientações das conclusões da pesquisa sobre a nossa Ordem concluída em 2013, isto é:
  2. que é urgente no interior das fraternidades resolver antes de tudo os notáveis problemas que dizem respeito à comunicação interpessoal dos frades e com os ministros e guardiães, a fim de que possa ser fluida, fraterna, respeitosa, rica de estima, capaz de gerir e superar os eventuais nós e conflitos, uma comunicação radicada na caridade e profundamente animada pela própria vida de fé;
  3. que do mesmo  modo  é  urgente  um  esclarecimento  sempre mais preciso e um aprofundamento da identidade carismática da vocação  franciscana OFM, fazendo crescer a estima em relação à vida religiosa. É tarefa explícita dos formadores oferecer uma correta visão da vida consagrada assim como aparece nos documentos do Magistério eclesial e franciscano em particular;
  4. que é necessário rever o estilo de gestão e o próprio exercício da autoridade e o caráter organizativo e decisional presentes no interior das fraternidades; superar a falta de partilha das escolhas da fraternidade e aquele isolamento devido muitas vezes à estranheza recíproca nas relações fraternas.
  5. Tudo isto sustentado e gerado por uma mais intensa vida de oração pessoal e comunitária.

 

B – Com referência aos jovens queremos concretizar, em todas as fraternidades, pelo menos uma ação entre as propostas em seguida

  1. Renovar o modo de viver e de comunicar o nosso carisma, para que seja compreensível e significativo para a cultura e a vida dos jovens de hoje; as nossas casas devem estar abertas aos jovens, para permitir-lhes experimentar a nossa forma de vida evangélica e abrir-se ao encontro com Deus.
  2. Estar abertos aos jovens, para escutá-los e acompanhá-los de modo autêntico e cordial; aproximar-se deles, acolhê-los sem julgá-los; amá-los com gratuidade, para o bem deles; oferecer-lhes os valores da nossa vida e missão.
  3. Na evangelização e na catequese, valer-nos da arte, da cultura e    da natureza à luz da Laudato si’; usar os instrumentos das novas tecnologias para convidar os jovens a participarem mais profundamente do mundo real, para envolvê-los na realidade dos pobres, da Igreja e de Deus de modo mais concreto e encarnado; fazer de modo que se criem conexões com pessoas de outras culturas, países e continentes.

 

C – Com referência ao cuidado da “casa comum”, em todas as fraternidades, queremos realizar pelo menos uma das seguintes propostas

  1. Como indivíduos, como fraternidade, como Entidade e como Ordem internacional, fazer uma clara e radical opção pelas modalidades de vida indicadas pela Laudato si’, para viver autenticamente o nosso carisma e empreender um caminho de conversão ecológica (cf. LS 5; 216-221).
  2. Cuidar da formação dos Frades Menores com instrumentos fundados nos valores franciscanos, incluindo a experiência e a proximidade concreta às pessoas que sofrem; cada Entidade da Ordem deve inserir na formação inicial e permanente o tema da evangelização no espírito da Laudato si’, dando atenção especial à ecologia humana; em todas as entidades da Ordem promover ações concretas de ecologia integral com os nossos frades e nas atividades institucionais.
  3. Encaminhar e encorajar sempre mais a colaboração com outros grupos, organizações, peritos neste âmbito e com movimentos sociais que trabalham no campo da ecologia; ter maior diálogo com os cientistas e o diálogo ecumênico e inter-religioso sobre a Laudato si’; ajudar a traduzir aLaudato si’  de  encíclica  a  indicações  concretas para a nossa vida e para a nossa atividade pastoral.
  1. “Para que todo este empenho seja autêntico e fiel ao nosso chamado de Frades Menores, devemos aprender desde o princípio a escutar os irmãos, a escutar-nos uns aos outros, a ouvir os sonhos e as desilusões que cada um de nós traz consigo. Não só devemos permitir que Deus nos conduza a um amor renovado à Trindade, a Deus nas nossas vidas, mas também devemos permitir que Deus nos conduza a um amor renovado aos irmãos da Ordem. E devemos celebrar a bondade da nossa vida em fraternidade e o dom da vocação pessoal de cada um” (Fr. Michael Perry, ofm – mensagem final do CPO).

 

SUGESTÃO DE MÉTODO

  1. Pedimos que cada Entidade da Ordem, e cada fraternidade, traduza em escolhas concretas de vida as decisões acima expressas, valorizando possivelmente um dos seguintes percursos:
  • podem-se seguir os passos que a experiência do CPO e o seu documento final assinalaram, isto é, escutar, discernir e sair de modo a evidenciar dados e fatos da situação em que se vive e interpretá-los à luz do Evangelho para depois propor ou formular e experimentar escolhas concretas (cf. EG 51);
  • pode-se utilizar outro percurso que aconselha não partir dos problemas, mas de dados e de fatos positivos presentes nas Entidades e nas fraternidades, para depois formular objetivos que deem qualidade à caminhada fraterna, projetar intervenções e realizá-las (cf. “Appreciative Inquiry”).

Cada um destes percursos prevê a troca de ideias e o diálogo fraterno, orientados por perguntas pertinentes e atentos a valorizar os parágrafos do presente documento considerados úteis e importantes para precisar projetos de vida, ligados a cada contexto específico e em sintonia com a caminhada da Ordem.

 

 

ÍNDICE

APRESENTAÇÃO                                                                                   3

Siglas e abreviações                                                                                7

INTRODUÇÃO                                                                                         9

PARTE I: ESCUTAR                                                                               13

Escutar a realidade da OFM hoje nas Conferências                             15

Vida dos Frades Menores                                                                        15

Vida espiritual e vida fraterna dos Frades Menores hoje                     16

Situações de crise                                                                                     17

A presença dos Frades Menores                                                             18

Opção pelos pobres                                                                                 19

Acolhida de migrantes e refugiados                                                       20

Diálogo ecumênico e inter-religioso                                                        21

Cuidado da criação – JPIC                                                                     22

Ação social                                                                                               24

Pastoral de manutenção – Nova Evangelização                                   25

O mundo dos jovens                                                                                26

PARTE II: DISCERNIR                                                                           29

Alguns textos para refletir                                                                      30

Os Frades Menores                                                                                  33

Em um mundo que muda rapidamente                                                33

Fraternidade contemplativa em missão                                                34

Em relação aos jovens                                                                            37

Interpelados pela Encíclica Laudato si’                                                 39

Interpelados pelas situações dos migrantes e refugiados                      41

No mundo como instrumentos de paz                                                    42

Religiosos com a visão de Igreja do Papa Francisco                            44

Quem tem ouvidos escute o que o Espírito diz … aos Frades Menores hoje

PARTE III: SAIR                                                                                     47

Como Frades Menores                                                                             49

Em um mundo que muda rapidamente                                                49

Como Fraternidade contemplativa em missão                                      49

Com relação aos jovens                                                                           51

Comprometidos com a Encíclica Laudato si’                                         52

Comprometidos com os irmãos migrantes e refugiados                        53

No mundo como instrumentos de paz                                                    55

Com a visão de Igreja do Papa Francisco                                              56

CONCLUSÃO  59

Para partir de novo                                                                                 59

Sugestão de método                                                                                62