11 Dez Fazer o presépio com S. Francisco de Assis
O presépio não foi inventado por S. Francisco, mas foi recriado pela sua alma contemplativa e apaixonada por Jesus de Nazaré e de Belém. O Natal e Epifania de Jesus eram, desde os primeiros séculos cristãos, representados nas artes figurativas e celebrados liturgicamente, pelo menos desde o século IV, em toda a Igreja. Francisco teve, contudo, o mérito de despertar nos corações dos fiéis a devoção, algo adormecida, pelos mistérios do Verbo de Deus humanado, desde a anunciação à paixão e ressurreição. Por isso, o santo de Assis acompanha e celebra os passos deste augusto mistério, a começar na Anunciação: “O Pai Altíssimo, pelo seu arcanjo S. Gabriel, anunciou à santa e gloriosa Virgem Maria, que esse Verbo do mesmo Pai, tão digno, tão santo e glorioso ia descer do céu, a tomar a carne verdadeira da nossa humana fragilidade em suas entranhas. E, sendo Ele mais rico do que tudo, quis, no entanto, com sua bem-aventurada Mãe, escolher vida de pobreza” (2 CF).
Com tais palavras o Poverello evidencia a humanidade do Verbo do Pai que veio do céu para assumir a nossa “carne verdadeira”, habitando nas “entranhas de Maria”. Nesta “descida” de Deus ao seio da Virgem, Francisco vê o maior presente do Natal para toda a humanidade: Aquele que é o mais rico de tudo, o Sumo Bem e fonte de todos os bens, “faz-se pobre para nos enriquecer a todos”.
Movido e emocionado por tal mistério de Amor, no ano 1223, Francisco, encontrando-se em Greccio onde tinha amigos sinceros, depois de ver o trabalho da gente do campo e a ternura das crianças a brincar com suas mães, teve mais uma ideia das suas que apresentou ao amigo João Velita: queria celebrar o Natal ao vivo, no campo. Uma vez obtida a devida licença pontifícia, Frei Francisco pediu ao rico-homem João de Grécio, uns 15 dias antes do Natal, para preparar um presépio, a fim de nele celebrar ao vivo o mistério da Encarnação, na noite de 24 para 25 de dezembro desse ano.
Começaram os preparativos: uma gruta, uma mesa para altar, dois animais, uma manjedoira. Francisco explicou ao seu amigo o espírito deste Natal: “Senhor João, é preciso que nesse dia toda a gente esteja em festa, homens e animais”. Queria, de facto, que o Natal do Senhor fosse a “festa das festas: esse dia em que Deus, feito menino, se amamentava como todos os filhos dos homens” em que todos as criaturas deveriam tomar parte (TOMÁS DE CELANO, Segunda Vida,151, 199-200; cf. Espelho de Perfeição, cap. XII).
O Senhor João logo espalhou pelo povo a novidade, para que todos se preparassem. Dias depois, chegou a grande noite. Empunhando archotes e lanternas cantando cânticos e orações, metendo pelas estreitas veredas, o povo rumou à montanha que nessa noite se converteu na “nova Belém”. Desta vez a Eucaristia da noite de Natal ia ser mais participada e compreendida. Francisco, nas vestes de diácono, cantou o Evangelho da solenidade. Depois, proferiu uma sublime homilia: “Nesta noite o Deus da majestade faz-se nosso irmão. Ele, o maior de todos, quer ser o mais pequeno, último. Aproximou-se de nós sob o signo da fragilidade e da ternura […] No momento da comunhão, quando Francisco recebeu da sagrada partícula, o senhor João Velita, maravilhado, viu despertar e sorrir, entre os braços do grande amigo, um menino de estranha beleza” (ELOI LECLERC, Desterro e Ternura, 1974, 231-234).
O presépio que somos convidados a “reinventar”, com S. Francisco,
é esse monte das Bem-aventuranças onde os pobres viram ricos, e todas as criaturas confraternizam como irmãs;
é essa montanha onde mora a amizade partilhada com muitos;
é um lugar de encontro de todos os povos, sem muros nem fronteiras, onde todos “de boa vontade” cantam o gloria in excelsis;
é essa terra nova, onde a pobreza é fonte de riqueza e a riqueza é partilhada com justiça;
é esse caminho endireitado, onde o amor é a verdadeira omnipotência e o Omnipotente a todos ensina a amar como Ele amou;
é o tempo novo, onde a treva da noite é gémea da manhã e cada raiar do sol anuncia milhões de mães que dão à luz;
é essa “terra de pão”, onde a simplicidade é regra e a alegria está ao alcance de todos.
Francisco de Assis e de Greccio imaginou o presépio como essa grande “Eucaristia sobre o mundo”, em que todas as criaturas se reúnem e nutrem à volta da mesma manjedoura. Ele inspirou-se em Belém, para fazer o seu presépio; nós podemos inspirar-nos nele para recriar nossos presépios “ao vivo”, recriando em mossas vidas a noite de Belém, para que o Divino Menino nasça outra vez em muitos corações.
Fr. Isidro Lamelas
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